O João de Jesus d'A-metamorfose respondeu aqui a Miguel Sousa Tavares que terá dito «Não conhecemos, em todo o mundo árabe, o nome de um cientista, músico, arquitecto, cineasta, explorador, atleta, enfim, alguém que faça sonhar ou avançar a humanidade» sugerindo o nome de Abdus Salam, paquistanês e prémio Nobel da física em 1979. O João Miranda respondeu, apontando alguns factos concretos:
O João de Jesus voltou a responder e, reconhecendo a veracidade destas palavras, apontou que:
Está-se aqui a confundir o contexto sociocultural com o carácter pessoal da interpretação de uma crença religiosa. Pelas palavras de MST, apenas se pode concluir que se referia literalmente ao mundo árabe ou à sociedade constituída por países de religião islâmica. Embora neste referencial estejamos a considerar a influência que a religião possui ao nível político (caso contrário, provavelmente, não lhes chamaríamos países islâmicos), não estamos a falar das crenças que cada um dos elementos apresenta e da influência que cada uma exerce no seu trabalho específico. Se assim fosse, não haveria diferença entre ser muçulmano, estando toda a vida no Luxemburgo ou viver num país onde o islamismo é maioritário e o Estado apresenta características totalitárias.
Se seguirmos por este caminho, referindo a "influência do Islão" como factor do sucesso científico que Abdus Salam atingiu, podemos então seguir muitos outros dizendo igualmente que o Judaísmo foi crucial no trabalho desenvolvido por Einstein ou que o Cristianismo influenciou muito certamente a obra de Newton, Galileu (embora não lhe tenha valido de muito a representação terrena), etc. O que acontece é que, ao contrário de muitas correntes muçulmanas, ninguém nas civilizações ocidentais se põe a dizer que Darwin e Mozart são um fruto do cristianismo. Na minha opinião, esta atitude demonstra uma insegurança enorme já que se torna necessário relacioná-la com aspectos completamente laterais. Será equivalente a dizer que o HST também é o produto inegável da religião cristã.
Por muito que se queira, equiparar uma religião com o tipo de sociedade em que esta se pratica não é válido porque se tira uma conclusão a partir da crença de uma pessoa (que, aliás, nem é reconhecida pela maioria dos seus compatriotas) para depois a apresentar como relativa à sociedade de onde ela é proveniente. Um génio pode nascer em qualquer sítio, o que é verdadeiramente relevante é o país que acaba por acolhê-lo e onde este pode desenvolver o seu trabalho com maior facilidade. No caso em questão, como refere o João Miranda, Abdus Salam até foi educado numa universidade do império britânico. O João de Jesus diz também que Salam terá inspirado jovens cientistas muçulmanos. Provavelmente, terá. Tê-los-á inspirado a sair para se juntarem o ICTP, que fundou em Itália, precisamente com a intenção de ajudar jovens investigadores de países como o seu (as maiores percentagens de estudantes vêm de países asiáticos e africanos). Na biografia disponível na página da academia sueca pode ler-se também o seguinte:
Não é por acaso que Abdus Salam acabou no Imperial College, em Inglaterra, e não foi Penrose que se mudou de Oxford para a Universidade do Punjab. Falar de casos particulares, ainda assim, é uma amostra selectiva. O que é verdadeiramente ilustrativo é analisar os fluxos migratórios e aí percebe-se que uma grande parte dos cientistas portugueses, por exemplo, fez o seu doutoramento/trabalhou em universidades americanas e britânicas ou, em menor escala, alemãs ou francesas (até acontece, como se pode ver, dentro dos próprios países ocidentais). Em qualquer um destes casos, uma oferta de trabalho é geralmente aliciante. A nível global, esta tendência é também muito acentuada porque nos países de origem existe muito pouca procura por teóricos e as perspectivas de emprego rentável são muito menos favoráveis. Emigrar torna-se uma opção considerável.
E, sinceramente, assim de repente, não me recordo de ninguém que tenha ido estudar, por razões de carreira, para o Irão, para a Arábia Saudita ou sequer para a Turquia, que fica aqui mais perto. Sintomático, não?
"O problema é que Abdus Salam era paquistanês, não pertencendo ao mundo árabe. É certo que o Paquistão é um país muçulmano, mas Abdus Salam pertence a uma seita considerada herética pelos muçulmanos mainstream. Dificilmente o seu talento para a física pode ser atribuído à cultura árabe. Na verdade, foi educado em escolas do Império Britânico e fez a sua carreira científica no ocidente."
O João de Jesus voltou a responder e, reconhecendo a veracidade destas palavras, apontou que:
"Os três factos estão correctos. Mas não são suficientes para subtrairem a influência do Islão na sua vida, nem, e isto é o mais importante, dissolver o impacto que o seu trabalho e reconhecimento mundial tiveram, e ainda têm, em muitos jovens cientistas muçulmanos. Há melhor forma de «fazer sonhar»?
(...)
Abdus Salam [was] known to be a devout Muslim, whose religion does not occupy a separate compartment of his life; it is inseparable from his work and family life. He once wrote: «The Holy Quran enjoins us to reflect on the verities of Allah's created laws of nature; however, that our generation has been privileged to glimpse a part of His design is a bounty and a grace for which I render thanks with a humble heart»."
Está-se aqui a confundir o contexto sociocultural com o carácter pessoal da interpretação de uma crença religiosa. Pelas palavras de MST, apenas se pode concluir que se referia literalmente ao mundo árabe ou à sociedade constituída por países de religião islâmica. Embora neste referencial estejamos a considerar a influência que a religião possui ao nível político (caso contrário, provavelmente, não lhes chamaríamos países islâmicos), não estamos a falar das crenças que cada um dos elementos apresenta e da influência que cada uma exerce no seu trabalho específico. Se assim fosse, não haveria diferença entre ser muçulmano, estando toda a vida no Luxemburgo ou viver num país onde o islamismo é maioritário e o Estado apresenta características totalitárias.
Se seguirmos por este caminho, referindo a "influência do Islão" como factor do sucesso científico que Abdus Salam atingiu, podemos então seguir muitos outros dizendo igualmente que o Judaísmo foi crucial no trabalho desenvolvido por Einstein ou que o Cristianismo influenciou muito certamente a obra de Newton, Galileu (embora não lhe tenha valido de muito a representação terrena), etc. O que acontece é que, ao contrário de muitas correntes muçulmanas, ninguém nas civilizações ocidentais se põe a dizer que Darwin e Mozart são um fruto do cristianismo. Na minha opinião, esta atitude demonstra uma insegurança enorme já que se torna necessário relacioná-la com aspectos completamente laterais. Será equivalente a dizer que o HST também é o produto inegável da religião cristã.
Por muito que se queira, equiparar uma religião com o tipo de sociedade em que esta se pratica não é válido porque se tira uma conclusão a partir da crença de uma pessoa (que, aliás, nem é reconhecida pela maioria dos seus compatriotas) para depois a apresentar como relativa à sociedade de onde ela é proveniente. Um génio pode nascer em qualquer sítio, o que é verdadeiramente relevante é o país que acaba por acolhê-lo e onde este pode desenvolver o seu trabalho com maior facilidade. No caso em questão, como refere o João Miranda, Abdus Salam até foi educado numa universidade do império britânico. O João de Jesus diz também que Salam terá inspirado jovens cientistas muçulmanos. Provavelmente, terá. Tê-los-á inspirado a sair para se juntarem o ICTP, que fundou em Itália, precisamente com a intenção de ajudar jovens investigadores de países como o seu (as maiores percentagens de estudantes vêm de países asiáticos e africanos). Na biografia disponível na página da academia sueca pode ler-se também o seguinte:
"Salam returned to Pakistan in 1951 to teach mathematics at Government College, Lahore, and in 1952 became head of the Mathematics Department of the Punjab University. He had come back with the intention of founding a school of research, but it soon became clear that this was impossible. To pursue a career of research in theoretical physics he had no alternative at that time but to leave his own country and work abroad."
Não é por acaso que Abdus Salam acabou no Imperial College, em Inglaterra, e não foi Penrose que se mudou de Oxford para a Universidade do Punjab. Falar de casos particulares, ainda assim, é uma amostra selectiva. O que é verdadeiramente ilustrativo é analisar os fluxos migratórios e aí percebe-se que uma grande parte dos cientistas portugueses, por exemplo, fez o seu doutoramento/trabalhou em universidades americanas e britânicas ou, em menor escala, alemãs ou francesas (até acontece, como se pode ver, dentro dos próprios países ocidentais). Em qualquer um destes casos, uma oferta de trabalho é geralmente aliciante. A nível global, esta tendência é também muito acentuada porque nos países de origem existe muito pouca procura por teóricos e as perspectivas de emprego rentável são muito menos favoráveis. Emigrar torna-se uma opção considerável.
E, sinceramente, assim de repente, não me recordo de ninguém que tenha ido estudar, por razões de carreira, para o Irão, para a Arábia Saudita ou sequer para a Turquia, que fica aqui mais perto. Sintomático, não?
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