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Thursday, March 02, 2006

Mumbo Jumbo 560

Recentemente, a cadeia de supermercados Jumbo lançou uma campanha que pôs aqueles que odeiam a liberdade todos contentes. Dizia a campanha do Jumbo que ao comprar nacional estamos a "ajudar Portugal".

O Jumbo não explicava no seu anúncio por que razão comprar produtos portugueses ajuda Portugal. Parece partir apenas da típica falácia mercantilista que implica que "importar é mau" e por isso devemos defender a produção nacional a todo o custo. Faz-me lembrar um colega meu que dizia com muito orgulho que os portugueses deviam comprar pêras portuguesas em vez de espanholas. Quando confrontado com a pergunta acerca do que fazia ele, pessoalmente, respondeu que comprava as espanholas porque eram mais baratas. Mas ali continuava ele, a atacar a baixa qualidade das pêras espanholas comparadas com as lusas.

Portugal não é uma entidade unilateral. É um país constituído por milhões de pessoas que pensam e agem de forma diferente, possuem necessidades distintas umas das outras e se deparam com uma diversidade enorme de situações e condições. "Ajudar Portugal", portanto, é algo completamente vago e irrealista quando associado à ideia quase proteccionista de que apenas por comprar um produto feito em Portugal se está a ajudar o país. Na verdade, está-se a fazer exactamente o contrário. Para a maioria das pessoas isto é contra-intuitivo mas a realidade é bem mais dura quando optamos por ignorar completamente a forma como é transferida a riqueza de pessoa para pessoa ou, em termos gerais, de país para país.

Suspeitei, portanto, que a intenção do Jumbo fosse outra. Como entidade de venda a retalho (em massa), não parece boa ideia que se diga aos clientes que prioritariamente se deve comprar português apenas pela questão da nacionalidade. É comum que este ou aquele produto português não seja a melhor opção para muita gente por isso o Jumbo poderia arriscar-se a perder ao incentivar o consumo de produtos de menor qualidade ou de preço mais elevado. A primeira coisa que me ocorreu foi um contrato importante com diversos produtores portugueses para que os seus produtos fossem alvo de uma publicidade preferencial. Esta hipótese é muito difícil, senão mesmo impossível de confirmar. O segundo pensamento que me assolou o espírito foi o de que o Jumbo estaria a promover produtos que fizessem parte da sua própria marca. Qual não foi o meu sorriso de ironia ao ver este catálogo no qual se vêem, praticamente em todas as páginas, produtos pertencentes à marca "Auchan". As pequenas mensagens laterais são também absolutamente adoráveis.

Diz na 3ª página que:

"É fundamental apoiar a produção portuguesa!

Ao comprar produtos feitos em Portugal está a contribuir para o crescimento económico e para o aumento dos postos de trabalho do seu país. Porquê esperar para mudar os seus hábitos? Mude de atitude, compra português!"
A página 11 afirma que:

"São produtos fabricados em Portugal por marcas nacionais, multinacionais ou mesmo internacionais, mas são produtos feitos com mão de obra nacional, que contribuem superiormente para a nossa economia e para o emprego no nosso país."

Página 13, com mais uma pérola:

"Um pequeno gesto pode ajudar produtores nacionais. Na hora de escolher, compre produtos cujo código de barras é 560."

Página 19:
"Na hora de escolher é bastante fácil tomar uma atitude correcta."

Enquanto observo, interessado, a existência de uma fórmula tão simples para aumentar o crescimento económico baseada na compra de produtos produzidos em Portugal (provavelmente, deveríamos fechar as fronteiras para impedir a importação e assim maximizar o crescimento económico português...), vejo também com curiosidade que o Jumbo consiga estudar em 3 ou 4 linhas o impacto que as importações têm na economia nacional, a influência de todas estas pequenas variáveis (completamente inacessíveis ao comum dos mortais) no poder de compra dos diversos consumidores e retirar igualmente conclusões acerca dos investimentos pessoais que cada indivíduo faz. Estes investimentos, para além de dependerem muitas vezes do tipo de produto intermédio utilizado, são as oportunidades que geram emprego. Questiono-me sobre qual será essa misteriosa razão que faz com que um produto português torne automaticamente um negócio mais rentável.

Uma resposta positiva a esta campanha do Jumbo não pode garantir sequer o combate directo ao desemprego da forma tal como é anunciada porque o Jumbo não consegue definir numericamente o impacto directo que se dá na actividade comercial com a diminuição das vendas de produtos estrangeiros por todo o território nacional. A única argumentação lógica que justifica esta acção é um apoio aos produtores que, por não conseguirem satisfazer os seus clientes, (ao ponto de manter a estabilidade da sua empresa) se vêem em dificuldades perante a concorrência estrangeira. Por outras palavras, se a empresa fosse eficiente e gerasse o tipo de produtos que são procurados pelos consumidores de acordo com as regras típicas de uma economia de mercado, não seria necessário apelar ao "patriotismo do cliente" para que estes se tornem subitamente mais valiosos. Adicionar uma espécie de nacionalismo à equação apenas vem demonstrar que é necessário apelar a uma eventual causa maior para que as empresas consigam escoar os seus produtos convenientemente ou obter um "lucro artificial".

Não se deve deixar que as pessoas sejam levadas por propaganda enganosa que tem como intenção única aproveitar uma crença popular de economia para tirar vantagem sobre os seus clientes. Não deixar que ninguém escolha por elas o que apenas elas podem escolher. Isso inclui, obviamente, o direito de comprar um produto português apenas porque se diz ser português. No entanto, a escolha é sua e é necessário recordar que Portugal são os portugueses e, portanto, o que as beneficiar, estará a beneficiar directamente Portugal.

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