Um hábito relativamente intrincado nos elementos da sociedade portuguesa é o julgamento moral dos gastos das pessoas que os rodeiam. Está no sangue e talvez seja por isso que, em abstracto, tanta gente se encontra predisposta a que seja uma entidade externa a gerir uma fatia bastante alargada do seu dinheiro e nem sequer se aperceba (nem, basicamente, se importe) de outros "retoques" no valor real dos seus rendimentos e dívidas.
Com a chegada desta época de Verão, vai-se tornando novamente frequente (é coisa que se repete de forma sazonal, em especial, de 2 em 2 anos, com os campeonatos de futebol) ouvir vezes sem conta aquele comentário popular ao qual também sucumbiu José Saramago nas suas declarações sobre o Plano Nacional de leitura: "Há dinheiro para gastar". [Provavelmente, esta observação deixaria Saramago muito ofendido - onde é que já se viu comparar a intelectualidade elitista com o mexilhão? A sorte de quem fala sobre tal ilustre personalidade utilizando estes meios é que Saramago julga que as tecnologias actuais são perniciosas. Deve ser mais fácil encontrar Saramago a abraçar Fidel Castro do que a ler a blogosfera portuguesa.]
Esta característica tão lusa (diriam alguns, mediterrânica) nasce da ideia que nutrem as dominadoras mas férteis mentes sequiosas de controlo sobre a suposta quantidade de riqueza fixa que existe a dado momento. Acontece que a riqueza não equivale ao capital e não se manifesta necessariamente sob a forma monetária nem, obviamente, implica "perdas" económicas como a bastante aceite ideia de que os ricos estão cada vez mais ricos e os pobres cada vez mais pobres, e assim por diante.
Assim sendo, há algumas coisas que não são propriamente julgadas de forma intelectual, reduzindo-se apenas a ser dissecadas de uma aparente perspectiva que se baseia numa autoridade moral absolutamente inexistente e injustificável:
Com a chegada desta época de Verão, vai-se tornando novamente frequente (é coisa que se repete de forma sazonal, em especial, de 2 em 2 anos, com os campeonatos de futebol) ouvir vezes sem conta aquele comentário popular ao qual também sucumbiu José Saramago nas suas declarações sobre o Plano Nacional de leitura: "Há dinheiro para gastar". [Provavelmente, esta observação deixaria Saramago muito ofendido - onde é que já se viu comparar a intelectualidade elitista com o mexilhão? A sorte de quem fala sobre tal ilustre personalidade utilizando estes meios é que Saramago julga que as tecnologias actuais são perniciosas. Deve ser mais fácil encontrar Saramago a abraçar Fidel Castro do que a ler a blogosfera portuguesa.]
Esta característica tão lusa (diriam alguns, mediterrânica) nasce da ideia que nutrem as dominadoras mas férteis mentes sequiosas de controlo sobre a suposta quantidade de riqueza fixa que existe a dado momento. Acontece que a riqueza não equivale ao capital e não se manifesta necessariamente sob a forma monetária nem, obviamente, implica "perdas" económicas como a bastante aceite ideia de que os ricos estão cada vez mais ricos e os pobres cada vez mais pobres, e assim por diante.
Assim sendo, há algumas coisas que não são propriamente julgadas de forma intelectual, reduzindo-se apenas a ser dissecadas de uma aparente perspectiva que se baseia numa autoridade moral absolutamente inexistente e injustificável:
1. O valor que cada pessoa atribui a algo é puramente subjectivo. Enquanto um bilhete para o Mundial da Alemanha pode pessoalmente ter uma importância nula (ignorando o caso de se conhecer o seu valor no mercado e desejar lucrar com a sua compra), para outra pessoa pode ser um assunto muito sério. Enquanto a primeira não estaria sequer disposta a gastar dinheiro com algo tão fútil, a segunda pode chegar a oferecer um valor superior ao considerado normal, dada a relevância que a matéria assume para si. Este facto é uma consequência das diferenças entre as pessoas, os seus gostos, as suas prioridades e suas ambições. Se todos os seres humanos fossem iguais, certamente o mundo seria uma coisa muito mais assustadora do que já é.
2. Como a primeira pessoa não consegue, à partida, compreender o valor que é dado ao objecto em questão, não entende também que esta preferência pode implicar uma ordenação alternativa (em referência à sua) das prioridades no que toca à gestão do orçamento pessoal. Aqui entra a conclusão precipitada (e muitas vezes propositada) que a esquerda populista tanto gosta de usar para promover os ideais da equidade de rendimentos. Ao ver que alguém gasta dinheiro em algo que, de acordo consigo, é um gasto supérfluo, esta pessoa tenderá a dizer que "há dinheiro" para coisas assim, implicando que o alvo das suas críticas tem recursos suficientes para cobrir todas as despesas que o autor da frase teria, em adição àqueles "luxos". O erro está em assumir que a pessoa que compra o bilhete valoriza mais todas as outras coisas que a primeira pessoa tem como certas, em contrapartida ao bilhete comprado. Não pressupõe que, por exemplo, a pessoa tenha poupado dinheiro durante vários meses para o poder adquirir ou que tenha feito menos despesas de consumo diário para poder concretizar o seu outro desejo de ir assistir a uma partida de Portugal ao vivo.
3. Este raciocínio aplica-se a quase tudo o que é tido como objecto de luxo para um dado indivíduo. Poderá ser um jogo de futebol da liga dos campeões, umas férias na Polinésia, uma operação plástica, etc. A única matéria de dissidência é sobre o consenso relativo ao que deve ser classificado como consumo de luxo - não fosse a subjectividade o parâmetro em discussão. Para alguém que não tenha dinheiro suficiente (ou não o tenha poupado) para fazer umas férias na praia, passar várias semanas a esturricar ao sol poderá ser considerado um luxo. Comprar um carro novo pode ser considerado um luxo mas isso não implica, de forma alguma, que a pessoa que o pagou, ou ainda esteja a pagar, não tenha de gerir minuciosamente o seu orçamento para poder cumprir as prestações com que se comprometeu.
4. Retirar, portanto, conclusões sobre a riqueza pessoal de alguém, com base na sua aparência externa de riqueza, é demasiado simplista para ser válido até porque existem muitas pessoas para quem a própria aparência externa de riqueza é um bem muito valorizado o que, tal como foi explicado, não implica que estas sejam, de facto, ricas. De igual modo, a aplicação de economias num dado bem (que, para um observador externo, pode ser considerado um gasto desnecessário) não permite concluir que a pessoa tenha recursos financeiros estupendos.
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