Não percebo nada de politica mas voto no partido X
Inúmeras vezes me deparo com gente que não tem a mínima noção de política. Embora eu creia que as pessoas deveriam estar extremamente atentas a esse mundo – pois disso dependem as suas vidas pessoais – muita gente não pensa de tal forma, preferindo relegar o mundo das decisões políticas para segundo plano ou, mais inteligentemente ainda, para “os outros”. Este aspecto, que já por si próprio é suficientemente grave, expande a sua relevância pelo simples facto de que estas ditas pessoas claramente crêem ser autênticas autoridades no assunto. Obviamente não reclamo eu, como cidadão, ter mais autoridade intelectual do que elas mas uma vez que leio e me informo minimamente, tenho consciência do que afirmo relativamente aos assuntos sobre os quais pronuncio a minha opinião, caso contrário limito-me a ouvir.
Na verdade, parece que os portugueses, em geral, se julgam conhecedores de todos os sistemas políticos portugueses, europeus e outros internacionais – em particular o americano – embora sejam facilmente identificados como simples propagadores de contos do vigário por parte de alguém com uma parcela ínfima de conhecimento da realidade. Isto porque, com um mínimo de leitura de alguns minutos em páginas (isentas) de acesso público na Internet, se podem compreender as diferenças básicas (e, infelizmente, as semelhanças) entre as várias instituições governamentais em todo o mundo e as respectivas leis de ditos países, desmontando assim 90% das crenças que estas pessoas não só possuem como ajudam constantemente a fomentar entre aqueles que lhes são próximos.
Mais intrigante ainda, talvez seja o facto de que os acima referidos “desconhecedores” (para não lhes chamar algo mais contundente) não se limitam apenas a mandar as suas típicas postas de pescada sem qualquer base argumentativa mas também a insultar os outros por não partilharem as suas visões politicas, estejam estas deturpadas como estiverem. Provavelmente, ainda mais alarmante do que isso seja demonstrar claramente a falta de perspectiva ou a ausência total de uma noção mínima do que se diz, pela qualidade de insultos que são dirigidos àqueles que, para qualquer dos efeitos, facilmente identificam o estatuto ideológico dos seus interlocutores, já que conhecem relativamente bem o espectro politico. Assim, talvez não seja de estranhar ter sido pessoalmente rotulado várias vezes de – e passo a citar – comunista, (neo) nazi, absolutista, revolucionário, monopolista, mercenário, eremita, parasita, fascista, anti-social, clientelista apenas para nomear as nomenclaturas mais simpáticas (e, porventura, eruditas!) entre elas. Como deve ser possível notar com bastante evidência, muitos destes nomes carinhosos são incompatíveis entre si enquanto que a maioria – embora talvez não pareça para os tais que os usam como insultos envenenados pela propaganda – tem, na verdade, muito que ver entre si.
Curiosamente nunca me insultaram chamando-me de socialista ou social-democrata porque isso sim, além de ser muito normal (no sentido de comum, obviamente), é o estatuto básico de ser português. [1] Em Portugal, praticamente toda a gente é de centro ou do que crêem ser o centro político. Para estas pessoas, o centro significa não só a não-identificação com nenhum dos partidos em particular como o flexibilidade em votar em mais do que uma cor política ao longo da sua vida, consoante um partido prometa tomar medidas que se efectuem no interesse de uma determinada classe de cidadãos. Escusado será igualmente afirmar que as taxas de abstenção em Portugal se encontram directamente relacionadas com este aspecto. Para demonstrar isso basta reparar que quando a abstenção diminui consideravelmente, aumentam também os votos dos partidos de já famoso “centro político”, como agora muita gente lhe decidiu começar a chamar embora de centro não tenha muito. Em especial, nas últimas eleições legislativas, notou-se um voto massivo no partido socialista simultaneamente como apoio ao nosso (salvo seja) primeiro-ministro Armani – que prometeu não aumentar os impostos e agora parece estar visivelmente a cumprir a sua palavra – e como voto de castigo no anterior governo de coligação liderado por Santana Lopes e Paulo Portas, na substituição de Durão Barroso que arranjou um “emprego mais viável e lucrativo” (igualmente, para não lhe chamar uma coisa mais contundente) em Bruxelas. O PS ganhou o centro político com maioria absoluta e o parlamento efectuou uma viragem à esquerda. Não admira, pois, que PS e PSD ganhem eleições alternadamente coisa que, olhando para o resto do cenário político português, tenho dificuldade em confirmar se será apenas mau ou simplesmente menos mau.
Os eixos políticos
Para evitar que as pessoas continuem a fazer as figuras deprimentes e insultuosas que fazem normalmente – peço (quase rogo) que se informem antes de se pronunciarem. Não só mostram o desconhecimento acerca de um determinado tópico, no qual tentam passar por peritos, como contribuem para o aumento da ignorância que já por si se espalha sem que seja necessário nenhum empurrão de boa vontade. Para citar um exemplo leia-se um pequeno excerto publicado na TSF acerca dessa grande figura do panorama político português, Jerónimo de Sousa, secretário-geral do Partido Comunista Português:
“É conhecida a história de como se apresenta à Assembleia Constituinte: Jerónimo de Sousa faz questão de explicar que não é doutor, mas deduzem que se trata de um engenheiro.
O actual líder do PCP frequenta até ao quarto ano do curso industrial, no horário nocturno, mas orgulha-se de ter aprendido muito com os intelectuais comunistas.”
Questiono-me com que espécie de intelectuais terá J. De Sousa convivido e ainda mais com que base experimental se poderão justificar. Coreia do Norte? Rússia? Cuba? China? RDA? Caso J. De Sousa não tenha reparado a politica é uma ciência com partes teórica e experimental e ditos intelectuais parecem ter esquecido esta última quando efectuam os seus comentários. O melhor será mesmo deixar esta questão para mais tarde porque o comunismo – parecendo que não, a priori, para os mais distraídos – tem mesmo muito que se lhe diga.
Voltando ao tema central deste artigo, muitas vezes, depois de fazer um comentário anti-marxista e, quando necessário, explicar que a teoria económica do marxismo é a base do comunismo, o meu interlocutor pressupõe que eu seja fascista (pois identificam o fascismo com a direita) até que sou forçado a explicar que sou anti-marxista precisamente porque sou anti-fascista e não tolero autoritarismos. É então que as pessoas ficam mesmo confusas e, muitas das vezes, furiosas pela consciencialização da sua ignorância espelhada na sua incapacidade de classificar correctamente as opiniões politicas. “Espera lá…não és de esquerda e não és fascista, então que raio és tu afinal?” É precisamente isso que quero esclarecer já que, na sua generalidade, as pessoas não compreendem e, mesmo depois de explicado pormenorizadamente, continuam a questionar apreensivamente.
Existem várias formas de classificar as ideologias políticas mas talvez o que se encontre com maior vulgaridade seja um sistema de dois eixos à semelhança dos gráficos cartesianos em que há um para as abcissas e outro para as ordenadas. No caso do “plano cartesiano” da política um dos eixos corresponde às ideologias económicas e outro às políticas relativas aos assuntos pessoais e à sociedade em geral, como se pode ver na figura seguinte referente a um teste da Advocates for Self-Government.
Legenda:
Personal Issues Score – Pontuação em assuntos pessoais
Economic Issues Score – Pontuação em assuntos económicos
Centrist – Centrista
Left/Liberal [2] – Esquerda
Statist/Big Government – Estatista/Governo de grandes dimensões
Right/Conservative – Direita/Conservador(a)
Libertarian – Libertário/Anarquista
Esquerda e Direita
Originalmente definições criadas devido ao lugar onde se sentavam os defensores de determinadas ideologias, Esquerda e Direita deixaram de ser suficientes com a diversidade de regimes e partidos que foram surgindo, retirando ideias de vários sectores e diversificando as suas posições. Actualmente existem muitas outras formas de efectuar as classificações políticas e até outros tipos de gráficos (nem sempre imparciais) que apenas consideram um eixo Esquerda – Direita e outro Anarquia – Autoritarismo ou denominações semelhantes. Esse género de gráfico é, no entanto, mais comum em países onde as politicas económicas da “esquerda” e da “direita” são mais bem definidas, como nos países de cariz anglo-saxónico. Existem até outros gráficos propostos que consideram um outro eixo (gráfico a 3 dimensões) adicionando ainda maior complexidade. [3]
Esta imagem disponibilizada pela Bússola Política do Público é uma versão adaptada do teste “Political Compass” que, na sua versão original, não faz precisamente a distinção entre capitalismo e socialismo (colectivismo) mas sim entre esquerda e direita. Partilho a opinião de Pedro Magalhães expressa na página, ao afirmar que talvez não seja o melhor teste político.
“A segunda [vantagem], mais importante, resulta do facto de partir do princípio que o eixo esquerda/direita, definido na base de visões alternativas sobre como devem ser redistribuídos os recursos nas nossas sociedades (opondo, para simplificar, Socialismo e Capitalismo), não chega para traçar o mapa ideológico das democracias ocidentais. Mudanças nas experiencias ocupacionais, educacionais e de estilos de vida dos cidadãos fizeram com que uma segunda dimensão dos conflitos ideológicos se tivesse tornado relevante: "libertarianismo" versus "autoritarismo", definida na base de visões alternativas sobre o grau de autonomia dos indivíduos em relação a sociedade e ao Estado e o grau de respeito devido a autoridade e a tradição.”
Magalhães defende, assim como eu, que o socialismo versus capitalismo não é suficiente para cartografar as ideologias ocidentais. No entanto, afirma-o de forma a justificar a existência de um novo eixo “libertarianismo” versus “autoritarismo”, como se fosse possível classificar as sociedades utilizando apenas o cariz económico. O que falha em todo este processo é o facto de que, apesar de utilizar dois eixos semelhantes ao primeiro gráfico disponibilizado pela Advocates for Self-Government (e não os da versão original que se resumiam a Esquerda – Direita e outro Anarquia – Autoritarismo como referia num parágrafo anterior), simplifica os quadrantes políticos presentes, etiquetando-os de Esquerda ou Direita, enquanto que o outro resumo gráfico, da Advocates, estratifica com maior precisão esta questão. É, possivelmente, trabalhoso para uma pessoa que até agora não tenha grande experiência na visualização destes gráficos entender a sua organização esquemática, mas pensemos por um pouco. Um exemplo bastante próximo será o do Estado Novo que era um regime autoritário e conservador em aspectos sociais mas, no entanto, socialista/intervencionista no que toca ao regime económico. Basta recordar que não se podia beber Coca-Cola simplesmente porque estava proibida. Isto é um exemplo básico acerca de restrições económicas. Outro dos aspectos mais relevantes era o facto de serem concedidos monopólios a empresários em determinadas áreas nas quais apenas eles podiam exercer aquela actividade (restringindo portanto o mercado livre), em troca de algumas burocracias. No entanto, apesar de todos estes aspectos toda a gente concordará que o Salazarismo era um regime de direita. Passemos para o caso de Hitler. O seu partido era nacional-socialista e nacionais-socialistas continuam a ser os seus seguidores. Não é, portanto, por acaso, que é possível ver em algumas manifestações do “orgulho branco” bandeiras pintadas dizendo “Socialismo Sempre” em conjunto com uma suástica ou duas. Mas então se os neonazis são socialistas, são de esquerda ou de extrema-direita (como são geralmente identificados)? É este o paradoxo a que se destina um mapa que simplifique quatro quadrantes em duas colunas primárias intitulando-as de “esquerda” e “direita” já que apenas contribui para a incompreensão das classificações em questão.
Tradições locais
A origem de todo este problema de adaptação surge devido ao facto de que o mapa do “Political Compass” afirma que a classificação “Esquerda – Direita” é insuficiente e tenta adicionar um eixo perpendicular a este, relativamente aos assuntos pessoais/sociais, ou seja, assume-se que a diferença básica entre a esquerda e a direita é a sua politica económica quando isso não é verdade. Como exemplo podemos tomar o Partido Trabalhista britânico (esquerda) cujos valores económicos actuais são mais liberalistas (capitalistas) do que a direita francesa ou alemã. Outro exemplo flagrante é o Partido Social-Democrata que em Portugal representa a direita conservadora mas internacionalmente é visto como um partido de esquerda (precisamente pela defesa do modelo social-democrata da economia).
É portanto óbvio que cada país possui as suas tradições e cada um precisaria de um esquema próprio quanto à posição de cada um dos partidos já que, muitas vezes, cada um assume uma diferente posição consoante a sua tradição parlamentar no país em questão. Infelizmente, em Portugal, encontram-se representadas na Assembleia da República todas as ideologias que controlam fortemente a economia desde o BE ao CDS-PP, ao passo que, os dois quadrantes da economia liberalizada (no primeiro gráfico, conservadorismo/direita e anarquia/liberalismo) simplesmente não estão presentes. Quem ouvir um debate do Parlamento até sente vontade de rir (não seja pela desgraça eminente que nos afecta a todos) já que todos os senhores deputados perdem imenso tempo com questões sobre as quais têm exactamente a mesma posição. A oposição às decisões de natureza económica nasce apenas por mera adesão do apoio popular, i.e., quando o partido X está no poder aumentam-se os impostos e os partidos Y e Z reclamam, juntando-se à impopularidade da ideia, de forma a adquirirem, de futuro, um maior número de votações. Se estivesse o partido Y no poder, este faria o mesmo tendo a oposição do partido X e Z que – obviamente – irão declarar que nunca cometeriam uma barbárie tal como aumentar os impostos de forma a prejudicar os cidadãos (mesmo que na legislatura anterior o tenham feito).
É, portanto, errado – se quisermos que sejam cobertas todas as ideologias politicas com maior precisão – chamar “Esquerda – Direita” ao eixo dos assuntos económicos ou, à semelhança da versão adaptada para Portugal do gráfico do “Political Compass”, dividir o gráfico em duas colunas, “Esquerda” e “Direita”. A representação mais correcta continua a ser, na minha opinião, uma similar ao gráfico apresentado pela Advocates. À semelhança deste existe também outro teste político, Moral Politics que apresenta a mesma estrutura do gráfico da Advocates e embora dê nomes distintos aos eixos, mostra a mesma divisão em quatro quadrantes: Liberalismo, Socialismo, Autoritarismo e Conservadorismo (respectivamente, Anarquia / Liberalismo, “Esquerda”, Estatismo e “Direita” no gráfico da Advocates).
A função das variáveis
Independentemente dos nomes que se dão aos eixos e aos quadrantes, o género mais comum de gráficos utiliza um sistema a duas dimensões que mede as liberdades económicas e as pessoais.
Todavia, a parte verdadeiramente importante é compreender a diferença entre os sistemas e poder reconhecê-la facilmente quando se fala acerca de uma determinada medida governamental (ou anti-governamental). Assim sendo, e passando a explicar, o eixo económico vai do colectivismo ao capitalismo. O colectivismo é o núcleo da teoria marxista aplicada, baseando-se na nacionalização dos bens privados, i.e., abolição da propriedade privada de forma a teoricamente redistribuir tudo o que é produzido de forma equitativa. Parafraseando o dogma marxista, "De cada um de acordo com as suas capacidades, para cada um de acordo com as suas necessidades" que tem muito bom aspecto à primeira vista mas depois se entende que é o governo que decide quais são as capacidades desejadas de cada cidadão, como/quando/onde deve trabalhar e quem recebe o dinheiro reunido pelo Estado (se alguém receber, na verdade, alguma coisa). Em suma, não podemos ter computadores, carros nem casas porque a noção de propriedade privada não existe e as coisas pertencem “ao povo” (eufemismo para “Estado”). O capitalismo rege-se precisamente pela ideologia contrária, utilizando axiomaticamente que todos temos direito à propriedade privada. As unidades monetárias existem como moeda de troca entre as diversas propriedades privadas disponibilizadas pelos diversos cidadãos, ou seja, compramos um carro de um stande de automóveis, um computador de uma loja de informática utilizando o dinheiro que ganhámos trabalhando para disponibilizar outros produtos ou prestando um serviço determinado. A meio caminho deste eixo existe o socialismo moderado (tradicionalmente, transição do capitalismo para o comunismo) e tipos de governos sociais-democratas e outros intervencionistas que sobrecarregam o cidadão com impostos e burocracia de forma a obter a sua contribuição para o tão pronunciado “bem comum”.
O outro eixo rege-se essencialmente pelas liberdades pessoais e não as liberdades de origem económica. Estas incluem aspectos relacionados com a necessidade de prestar serviço militar, restrição dos direitos de imprensa e liberdades de expressão, defesa da privacidade, consumo de drogas, controlo do comportamento social, etc. Neste eixo vamos desde o autoritarismo/totalitarismo (aquilo a que convencionalmente se chama ditadura) até à anarquia ou, utilizando o neologismo de Magalhães no seu artigo, “libertarianismo”. É de notar que neste eixo as definições se podem confundir com os quadrantes já que existem dois quadrantes chamados Autoritarismo (poucas liberdades pessoais e económicas) e Anarquia (muitas liberdades pessoais e económicas). Estes nomes são dados devido às posições extremas que tomam na disposição do gráfico já que conjugam quer a total falta ou existência de liberdades.
A anarquia rege-se – utilizando conveniente o pleonasmo – pela falta de regência, i.e., não se acredita que haja necessidade de controlar de alguma forma a população em termos pessoais e sociais. Em sociedades com carácter marcadamente anarquista a posse de armas é livre, não existem arquivos de identificação que recolham informações sobre os cidadãos, existe liberdade de imprensa e de expressão entre outras. Os regimes ditatoriais utilizam precisamente os mecanismos contrários, como deve (ou devia) ser desnecessário recordar a muita gente. São formuladas leis que proíbem os cidadãos de efectuar determinados actos que interferem com as suas actividades pessoais como catalogar os cidadãos pelo uso de uma identificação nacional, restringir os direitos de defesa pessoal e não permitir que se possa exprimir uma opinião que seja contraria às ideologias do regime vigente. Há recrutamento militar obrigatório, técnicas de censura e opressão, distinções raciais, imposições religiosas, diferenciação entre os géneros, etc., etc. Caso a memória em Portugal ainda seja uma capacidade prezada não será, certamente, necessário efectuar um esforço muito significativo para relembrar que ainda há pouco tempo a situação não era muito diferente e que ainda continuamos a viver das suas repercussões.
“Mas afinal que, raio és tu?”
Com isto chego ao ponto que desejava esclarecer no início mas que, na verdade, é a questão menos central de todo este artigo já que a verdadeira intenção é, ao contrário de impor opiniões a alguém, levar essas pessoas a reflectir sobre a realidade e a recuperar a iluminação neurológica que foi perdida algures na idade das trevas do condicionamento social feito em Portugal pelos regimes políticos com o excelente auxílio da propensão para o conformismo social. Eu sou um acérrimo defensor da prevalência dos direitos individuais sobre os direitos do Estado, quer sejam eles de natureza económica ou social o que significa que caio na definição de anarquista ou libertário consoante o esquema de classificações. De acordo com a adaptação feita para o Público – como é possível verificar acima – eu seria um libertário de direita já que se assume que a direita oferece liberdades económicas de algum género. A pergunta mais frequente talvez seja – se defendo a liberdade (e sou na verdade um libertário assumido) – por que razão me inclino tanto para criticar a falta de liberdades económicas. Não se assustem os mais cépticos – que ainda crêem que o fascismo está associado de alguma forma ao capitalismo – porque sou igualmente um defensor das liberdades pessoais mas, na minha perspectiva, a liberdade económica é precisamente o centro de todas as liberdades já que simboliza a valorização factual de todas as acções sociais; de forma mais simples, o sistema capitalista garante a liberdade pessoal de cada indivíduo. O assunto é, obviamente, muito mais complexo e por essa mesma razão merece ser discutido com maior minúcia.
Em Portugal defender a liberdade económica é, regra geral, um grande choque cultural porque as pessoas estão habituadas (conformadas) a não ter liberdades económicas mínimas. Para levantar a discussão em torno do assunto apenas posso colocar uma pergunta pertinente: existiu alguma vez alguma ditadura baseada na liberdade económica dos seus cidadãos para exercer as suas tendências autoritárias? O absolutismo histórico baseou-se na centralização de poderes porque era o rei quem detinha o maior poder económico. As plutocracias e as oligarquias formam-se precisamente porque as pessoas comuns não são agraciadas com esses direitos. Não aconteceu com Salazar, Mussolini, Hitler, Mão Tsé Tung, Castro, Estaline nem com outros da mesma estirpe. Todos estes regimes foram ou são alicerçados no controlo económico do cidadão para que este nem sequer tenha direito ou opção de se defender do regime. Para os ainda mais cépticos que deambulam por aí e, descaradamente, defendem o regime de Fidel Castro ou de Kim Jong-II verifiquem as páginas da Amnistia Internacional e o Índice de Liberdade Económica, para ficarem “mais” convencidos de que falo a verdade. Deixo, no entanto, como já referi anteriormente, a questão da fácil refutação das teorias económicas socialistas para outra ocasião.
Certamente, são alvos da crítica marxista países que dão maior liberdade económica como os EUA, o Japão e o Reino Unido (ambos fortemente marcados pelo tradicional modelo anglo-saxónico) mas muito dificilmente ouviremos – por razões plausíveis – um americano, um japonês ou um britânico queixar-se da opressão exercida pelo seu governo (embora o possam fazer livremente) ao passo que em países como Cuba e outros ao mesmo nível quem abrir a boca é detido por delito de opinión.
Assim, depois de longas explicações, creio que é minimamente expectável que após esta leitura se deixe de associar Hitler com o capitalismo, Che Guevara com a liberdade e a mim com todas as ideologias que jamais surgiram, o que inclui essa magnífica demonstração de esperteza saloia que se comete ao apelidar de neonazi ou fascista um liberal/capitalista e de comunista alguém que defende os direitos básicos de todos e de cada um de nós, quando o comunismo representa a negação desses mesmo direitos. O poder deve pertencer ao povo na qualidade da transferência de poderes para cada indivíduo, é esse o verdadeiro sentido de liberdade que parece há muito ter sido esquecido ou talvez nunca assimilado com coerência.
Agora já se sabe, quando alguém referir que existe um “eixo do mal” no mundo talvez não seja coincidência que se chamem eixos àquelas linhas que existem nos gráficos cartesianos e que são vulgarmente utilizados em teste de avaliação política e económica…
[1] Para aqueles que não acreditam e frequentemente me dizem que os portugueses são muito conservadores em vez de socialistas, recomendo-lhes visitar o site do teste Moral Politics que refiro ao longo do artigo. Estes são os resultados para Portugal que, ironicamente, é o segundo país europeu onde mais gente realizou este teste até ao momento. O resultado actual aponta para 41,2% de apoiantes do socialismo. Um teste deste género nunca pode ser ilustrativo no seu todo por várias razões, incluindo a pequena amostra (e o seu tipo), tendenciosidades do próprio teste e eventuais margens de erro. No entanto, é representativo do que queria frisar. Se este ponto não for suficiente para chamar à atenção, encontrei também outro registo interessante: o de percentagem de deputados no parlamento europeu. Portugal tem 50% dos deputados na bancada socialista, ou seja, 12 de 24. Nenhum outro país tem tantos à excepção da Estónia (50%, 3 de 6) e de Malta (60%, 3 de 5).
[2] A palavra liberal nos EUA assume um significado diferente daquele que ostenta na língua portuguesa. Enquanto que na Europa liberal tanto pode significar liberalização económica como liberalização de medidas pessoais ou sociais, nos EUA a palavra liberal encontra-se associada a tendências de esquerda. Desde o início, o seu significado diferiu do seu congénere em british english mas a origem da diferença (ideológica) associada provém do apoio que foi dado a Franklin Roosevelt pelos “liberais” americanos no seu New Deal, um programa estatal que pretendia salvar a economia americana após a Grande Depressão, tornando o Estado americano no chamado “Estado de bem-estar” ou “Estado social” (welfare state). Estas medidas baseavam-se nas teorias do britânico John Keynes que, infelizmente para todos nós, foi um dos economistas mais influentes deste século XX. A palavra liberal tornou-se ainda mais demarcada após a Segunda Guerra Mundial, nos tempos do McCarthyism, quando os próprios apoiantes da esquerda deixaram de se chamar a si próprios comunistas, socialistas ou sociais-democratas para evitar as conotações negativas que haviam sido criadas na sociedade americana. A denominação de libertarian em american english acabou por espelhar essa mesma realidade, pois foi criada para identificar aqueles que eram apoiantes do liberalismo clássico do laissez-faire e não das teorias intervencionistas.
[3] A versão inglesa da Wikipedia possui um artigo intitulado Political Spectrum que explica, em termos gerais, alguns dos sistemas de classificação politica. O meu propósito primário é o de mostrar imagens (razão pela qual ceder uma ligação à Wikipedia é aceitável) dos quadros de Nolan – fundador do Libertarian Party – e de Eysenck, nos quais se baseiam os gráficos discutidos neste texto.
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