A imprensa portuguesa parece ter um problema sério com a realidade. Os telejornais abrem todos em uníssono com a polémica em torno da lei das finanças regionais, deixando para segundo o plano o que se está a passar nos mercados internacionais, como se fosse menos relevante. O risco associado à dívida da república portuguesa atingiu máximos históricos, mas todas as cadeias de televisão parecem ignorar quase por completo a dimensão deste acontecimento, e depois de darem a respectiva notícia, não sem descarregarem uns minutos sobre as intrigas políticas do dia, arranjando espaço lá pelo meio para culpar "a especulação", "os investidores", "os mercados", Joaquín Almunia, as agências de notação financeira e mais algum bode expiatório de ocasião por todos os males, fazem notícia do próprio facto de isto ter sido noticiado na imprensa internacional. Numa espécie de reportagem que só poderia aparecer em países com profundos complexos de inferioridade como Portugal, mostram-se imagens da CNN, as páginas na Internet da Reuters, do Wall Street Journal, do Financial Times, e não sei mais quantos nomes aglomerados sob o epíteto de "imprensa estrangeira". Parece uma daquelas peças especiais que de vez em quando um dos canais faz sobre a forma como os jornais desportivos estrangeiros viram a prestação de Cristiano Ronaldo no jogo do fim-de-semana passado da liga espanhola. "Olha, estão a falar de "nós"!". Que orgulho.
Depois de muito chouriço enchido, lá aparece Sua Majestade, o ministro das finanças, com grande pompa e circunstância, depois de fazer toda a gente esperar uns quarenta minutos. A maioria provavelmente estaria à espera de uma declaração sobre os credit default swaps ou do prémio exigido pelos investidores na compra de obrigações do tesouro, mas o homem começa a falar da lei das finanças regionais, tal como os telejornais onde aparece em directo. E lá vem o ultimato à oposição. É uma grande estratégia, estilo 'terra queimada', para quem faz parte do governo e não se importa com o destino dos seus governados. Se Teixeira dos Santos for bem sucedido e a oposição recuar, assustada, mostra que pode ser domada pelo governo com suficientes ameaças; possivelmente os mercados internacionais interpretam isto como um sinal de que o ministro tinha razão nas suas declarações, pensam que a oposição colocou a mão na sua consciência e atribuem maior credibilidade aos anúncios até agora pouco fiáveis do ministro, acalmando os ânimos. O governo sai com a imagem de grande salvador em toda a situação. Se não resultar e a oposição se mantiver firme, o governo manter-se-á com o argumento de que a culpa de todos os problemas é da oposição (foi essa basicamente a intenção das declarações de ontem, relegar a responsabilidade por eventos futuros para outros), por ser despesista, quando todo estes anos o governo em funções fez exactamente aquilo que agora se lembrou de começar a criticar, mesmo quando as despesas imputadas à nova lei são irrelevantes quando comparadas com a despesa total do estado. O resultado na imagem externa é mais ambíguo, mas se os investidores atribuírem maior credibilidade à declaração do ministro do que aos argumentos da oposição (que afirma, ao contrário do ministro, que a lei permitirá um melhor controlo da despesa e do défice orçamental), o sinal é de que a despesa estatal portuguesa vai continuar descontrolada, mantendo parte do pânico que se verificou ontem. Adicionalmente, a instabilidade política em tempos que já são, por si mesmos, economicamente instáveis não inspira nenhuma confiança em quem tem de arriscar o seu dinheiro. A incerteza paga-se e as declarações de Teixeira dos Santos foram extraordinariamente arriscadas para a já débil imagem de Portugal, quando a lei está prestes a ser aprovada. Na ocasião de que os mercados financeiros não reajam a uma eventual aprovação da lei, depositando maior confiança na oposição, o governo passará simplesmente a colocar a 'crise artificial' que criou debaixo do tapete, e, a médio prazo, acabará por começar a reclamar para si os louros de uma recuperação da credibilidade externa do país, defendendo que a verdadeira razão pela qual isto se deu foi a sua proposta de orçamento.
Em todo o caso, com esta manobra de diversão, o ministro salvaguardou a imagem do governo perante os portugueses e preparou o palco para a fuga em frente, ou mesmo pela portas das traseiras caso se venha a mostrar necessário. Entretanto, ignorando todos os ludíbrios do governo para desviar as atenções dos problemas estruturais do país e correndo o risco de saírem queimados com a estratégia do ministro das finanças, os portugueses continuarão entretidos a falar mal de Alberto João Jardim e da Madeira, mostrando o seu desagrado (também conhecido por 'inveja') com o facto de os madeirenses pagarem uma taxa de IVA inferior ao do resto do país e não estarem dispostos a reduzir o montante que conseguem espremer anualmente do governo central, algo que todas as regiões do país tentam fazer sempre que têm a oportunidade. Hoje será um longo dia.
Depois de muito chouriço enchido, lá aparece Sua Majestade, o ministro das finanças, com grande pompa e circunstância, depois de fazer toda a gente esperar uns quarenta minutos. A maioria provavelmente estaria à espera de uma declaração sobre os credit default swaps ou do prémio exigido pelos investidores na compra de obrigações do tesouro, mas o homem começa a falar da lei das finanças regionais, tal como os telejornais onde aparece em directo. E lá vem o ultimato à oposição. É uma grande estratégia, estilo 'terra queimada', para quem faz parte do governo e não se importa com o destino dos seus governados. Se Teixeira dos Santos for bem sucedido e a oposição recuar, assustada, mostra que pode ser domada pelo governo com suficientes ameaças; possivelmente os mercados internacionais interpretam isto como um sinal de que o ministro tinha razão nas suas declarações, pensam que a oposição colocou a mão na sua consciência e atribuem maior credibilidade aos anúncios até agora pouco fiáveis do ministro, acalmando os ânimos. O governo sai com a imagem de grande salvador em toda a situação. Se não resultar e a oposição se mantiver firme, o governo manter-se-á com o argumento de que a culpa de todos os problemas é da oposição (foi essa basicamente a intenção das declarações de ontem, relegar a responsabilidade por eventos futuros para outros), por ser despesista, quando todo estes anos o governo em funções fez exactamente aquilo que agora se lembrou de começar a criticar, mesmo quando as despesas imputadas à nova lei são irrelevantes quando comparadas com a despesa total do estado. O resultado na imagem externa é mais ambíguo, mas se os investidores atribuírem maior credibilidade à declaração do ministro do que aos argumentos da oposição (que afirma, ao contrário do ministro, que a lei permitirá um melhor controlo da despesa e do défice orçamental), o sinal é de que a despesa estatal portuguesa vai continuar descontrolada, mantendo parte do pânico que se verificou ontem. Adicionalmente, a instabilidade política em tempos que já são, por si mesmos, economicamente instáveis não inspira nenhuma confiança em quem tem de arriscar o seu dinheiro. A incerteza paga-se e as declarações de Teixeira dos Santos foram extraordinariamente arriscadas para a já débil imagem de Portugal, quando a lei está prestes a ser aprovada. Na ocasião de que os mercados financeiros não reajam a uma eventual aprovação da lei, depositando maior confiança na oposição, o governo passará simplesmente a colocar a 'crise artificial' que criou debaixo do tapete, e, a médio prazo, acabará por começar a reclamar para si os louros de uma recuperação da credibilidade externa do país, defendendo que a verdadeira razão pela qual isto se deu foi a sua proposta de orçamento.
Em todo o caso, com esta manobra de diversão, o ministro salvaguardou a imagem do governo perante os portugueses e preparou o palco para a fuga em frente, ou mesmo pela portas das traseiras caso se venha a mostrar necessário. Entretanto, ignorando todos os ludíbrios do governo para desviar as atenções dos problemas estruturais do país e correndo o risco de saírem queimados com a estratégia do ministro das finanças, os portugueses continuarão entretidos a falar mal de Alberto João Jardim e da Madeira, mostrando o seu desagrado (também conhecido por 'inveja') com o facto de os madeirenses pagarem uma taxa de IVA inferior ao do resto do país e não estarem dispostos a reduzir o montante que conseguem espremer anualmente do governo central, algo que todas as regiões do país tentam fazer sempre que têm a oportunidade. Hoje será um longo dia.
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