Vou-me cansando de ler o regime e os seus respectivos propagandistas sobre o mísero crescimento económico de 0.3% que o país parece ter atravessado no segundo trimestre deste ano. Mesmo que se atribua alguma credibilidade a um indicador estatístico como o produto interno bruto, num momento em que tantos governos estão a aplicar políticas expansionistas (i.e., que o aumentam artificialmente através de gastos estatais), é de notar que França e Alemanha - os dois países da UE que exibiram também um crescimento minúsculo de 0.3% neste trimestre - são precisamente os maiores parceiros comerciais de Portugal, logo a seguir a Espanha, cujos resultados ainda não estão disponíveis. O facto de que uma ligeira recuperação económica sentida nestes países, cujas economias são de proporções muito mais determinantes para as tendências gerais europeias do que a portuguesa, tenha tido algum efeito na economia portuguesa, mesmo tendo em conta flutuações a curto prazo, muito dificilmente constitui uma grande surpresa, o que não quadra propriamente bem com a conclusão apressada de que as fenomenais políticas deste fenomenal governo são a causa inquestionável desta aparentemente fenomenal recuperação de uns fenomenais 0.3% desde o trimestre anterior.
Mais interessante ainda talvez seja como estas notícias recebem sempre um tratamento sistematicamente selectivo. Se analisarmos os dados disponíveis até ao momento para toda a zona euro, à excepção da Eslováquia, que provavelmente merece um tratamento excepcional por ter entrado nesta categoria apenas este ano, o país que teve um pior resultado neste trimestre foi a Holanda, com um recuo de 0.9%. A diferença entre os países que tiverem melhores resultados (Portugal, França e Alemanha) e a Holanda é de apenas 1.2%, algo que não é muito relevante e sugere, como naturalmente seria de esperar, que as economias da zona euro se estão a mover entre parâmetros bastante semelhantes. Isto é importante porque quem gosta de tentar defender a tese de que as políticas governamentais desta última administração foram muito bem sucedidas (ou seja, que não só é este crescimento trimestral um sinal claro de alguma recuperação económica relevante, como que foi o governo o grande responsável por essa recuperação), não faz comparações com outros sítios onde, geralmente, estas políticas não são assim tão populares: Singapura e Hong Kong também recuperaram no segundo trimestre de 2009, exibindo, respectivamente, crescimentos de 20.4% (base anual) e 3.3%. E já que estamos todos com vontade de divulgar dados estatísticos, também se pode apontar que o desemprego de longa duração em Portugal parece ter atingido máximos históricos, embora me pareça que, para bastante gente, desta parte também não convém falar muito.
Claro que o que realmente interessa é o crescimento a médio/longo prazo, para o qual os prognósticos, no que diz respeito a Portugal, não parecem ter-se modificado. De acordo com o Eurostat, nos últimos quatro anos, Portugal cresceu (um eufemismo para "estagnou") a um ritmo muito inferior ao da média da União Europeia (atenção, não unicamente da zona euro ou da "Europa a 15") e, provavelmente, continuará a fazê-lo no(s) próximo(s) ano(s) [ver tabela]. Da mesma forma, o PIB per capita em percentagem da média da União Europeia (mais uma vez, não unicamente da zona euro ou da "Europa a 15" - em relação a esses a discrepância é, obviamente, ainda maior) evoluiu de 76.9% em 2005 para 75.3% em 2008 [ver tabela].
É perfeitamente plausível que Portugal possa ter estado relativamente isolado dos efeitos directos desta última crise mundial, mas, nesse caso, será também verdade que parece estar praticamente isolado do crescimento que regularmente ocorre em quase todos os outros países. E sendo que uma crise financeira como a recente é praticamente insignificante, tal como foi a Grande Depressão, quando inserida no contexto de um crescimento económico que se prolongue indefinidamente de forma sustentada (a propósito deste assunto, vale a pena ver esta palestra de Alex Tabarrok), o panorama geral não augura nada de bom para o futuro. Contudo, que importa tudo isto? Com todo este crescimento brutal de 0.3% no último trimestre, é uma evidente blasfémia não querer admitir que a convergência económica está ali mesmo ao virar da esquina.
Adenda de 23/08: Foram entretanto divulgados os dados referentes à economia espanhola, tendo esta sofrido uma contracção de 1% no segundo trimestre. Apesar de o resultado ser negativo, nota-se, de acordo com os dados disponíveis, a mesma tendência de recuperação exibida pelos restantes países da UE, à excepção da Lituânia (Espanha recuou 3% no primeiro trimestre do ano). Quando se tem em mente este contexto, continua a parecer um acto de fé acreditar que o aparente crescimento de 0.3% em Portugal ocorreu devido a políticas internas. E tudo isto, claro, tendo ainda em conta que qualquer uma destas estimativas pode ser revista no futuro.
Mais interessante ainda talvez seja como estas notícias recebem sempre um tratamento sistematicamente selectivo. Se analisarmos os dados disponíveis até ao momento para toda a zona euro, à excepção da Eslováquia, que provavelmente merece um tratamento excepcional por ter entrado nesta categoria apenas este ano, o país que teve um pior resultado neste trimestre foi a Holanda, com um recuo de 0.9%. A diferença entre os países que tiverem melhores resultados (Portugal, França e Alemanha) e a Holanda é de apenas 1.2%, algo que não é muito relevante e sugere, como naturalmente seria de esperar, que as economias da zona euro se estão a mover entre parâmetros bastante semelhantes. Isto é importante porque quem gosta de tentar defender a tese de que as políticas governamentais desta última administração foram muito bem sucedidas (ou seja, que não só é este crescimento trimestral um sinal claro de alguma recuperação económica relevante, como que foi o governo o grande responsável por essa recuperação), não faz comparações com outros sítios onde, geralmente, estas políticas não são assim tão populares: Singapura e Hong Kong também recuperaram no segundo trimestre de 2009, exibindo, respectivamente, crescimentos de 20.4% (base anual) e 3.3%. E já que estamos todos com vontade de divulgar dados estatísticos, também se pode apontar que o desemprego de longa duração em Portugal parece ter atingido máximos históricos, embora me pareça que, para bastante gente, desta parte também não convém falar muito.
Claro que o que realmente interessa é o crescimento a médio/longo prazo, para o qual os prognósticos, no que diz respeito a Portugal, não parecem ter-se modificado. De acordo com o Eurostat, nos últimos quatro anos, Portugal cresceu (um eufemismo para "estagnou") a um ritmo muito inferior ao da média da União Europeia (atenção, não unicamente da zona euro ou da "Europa a 15") e, provavelmente, continuará a fazê-lo no(s) próximo(s) ano(s) [ver tabela]. Da mesma forma, o PIB per capita em percentagem da média da União Europeia (mais uma vez, não unicamente da zona euro ou da "Europa a 15" - em relação a esses a discrepância é, obviamente, ainda maior) evoluiu de 76.9% em 2005 para 75.3% em 2008 [ver tabela].
É perfeitamente plausível que Portugal possa ter estado relativamente isolado dos efeitos directos desta última crise mundial, mas, nesse caso, será também verdade que parece estar praticamente isolado do crescimento que regularmente ocorre em quase todos os outros países. E sendo que uma crise financeira como a recente é praticamente insignificante, tal como foi a Grande Depressão, quando inserida no contexto de um crescimento económico que se prolongue indefinidamente de forma sustentada (a propósito deste assunto, vale a pena ver esta palestra de Alex Tabarrok), o panorama geral não augura nada de bom para o futuro. Contudo, que importa tudo isto? Com todo este crescimento brutal de 0.3% no último trimestre, é uma evidente blasfémia não querer admitir que a convergência económica está ali mesmo ao virar da esquina.
Adenda de 23/08: Foram entretanto divulgados os dados referentes à economia espanhola, tendo esta sofrido uma contracção de 1% no segundo trimestre. Apesar de o resultado ser negativo, nota-se, de acordo com os dados disponíveis, a mesma tendência de recuperação exibida pelos restantes países da UE, à excepção da Lituânia (Espanha recuou 3% no primeiro trimestre do ano). Quando se tem em mente este contexto, continua a parecer um acto de fé acreditar que o aparente crescimento de 0.3% em Portugal ocorreu devido a políticas internas. E tudo isto, claro, tendo ainda em conta que qualquer uma destas estimativas pode ser revista no futuro.
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