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Wednesday, September 21, 2005

Porque Carrilho vai ganhando votos

[Conversa familiar]

Eu (E): Vou escrever uma carta ao Carrilho, o homem não bate bem de certeza.

Membro (M): Então porquê?

E: Quer instalar câmaras em Lisboa para vigiar os “bairros perigosos” e não diz exactamente como.

M: Quer o quê?

E: Implementar um sistema de vigilância de vídeo para seguir os movimentos das pessoas nas ruas. Só pode estar a gozar.

M: Ah, mas eu acho bem.

E: O quê?

M: Sim, é para apanhar os ladroes, isso vai haver [sic] porque há crime.

E: E? Existir crime é desculpa para violar os direitos individuais das pessoas?

M: Tu tens muito a mania dos direitos individuais [voz de desprezo] …

E: Nunca leste o 1984. Nota-se.

M: Se houver uma discussão a polícia pode ir lá para evitar mortos.

E: Claro, *só* demora 20 minutos ou mais.

M: Pois, 20 minutos.

E: Entretanto já eles morreram.

M: Ou não…

E: E desde quando é que um “talvez” serve para interferir assim com os direitos fundamentais das pessoas?

M: Não sei qual é o teu problema. Eu não tenho nada a esconder. Até parece que tu tens [voz de desprezo]

E: O meu problema é que não quero que o governo tenha arquivos com imagens minhas. É uma violação completa da privacidade.

M: Tu tens muito a mania da privacidade [mesma voz de desprezo]

E: Queres negar-me esse direito? Estou protegido pela Constituição Portuguesa.

M: Eu não tenho nada a esconder.

E: E? O que é que isso prova? Só porque não tens nada a esconder não te importa ser filmad@?

M: É para eles apanharem os ladrões. Tu, quando estás no Metro, também te fazem isso e tu não reclamas que não te estejam a filmar.

E: Ainda bem que falas nisso porque eu já fui assaltado no Metro, fui-me queixar e ninguém apanhou os ladrões.

M: …

E: A questão aqui é a de que não quero que me filmem. Ponto. Só porque tu achas que não tens nada a esconder isso não quer dizer que te deixes filmar “para apanhar os ladrões”. Até porque não há garantia nenhuma de que o consigam fazer.

M: Não estou sem roupa, não vejo qual é o problema. [nesta frase não sabia se havia de rir ou chorar]

E: Precisamente. Tu não vez qual é o problema e por isso queres impor-me essa medida com que tu concordas. Eu tenho o direito de a contestar porque viola os meus direitos de privacidade. Mesmo assim tu insistes no facto de que eu tenho a “mania da privacidade e dos direitos” e continuas a querer impor-ma.

M: Vais-te dar muito mal no estrangeiro.

E: Sim, deve ser por isso que há países em que nem há bilhetes de identidade.

M: …

E: Como te estava a dizer, tens direito à tua opinião. Mas ela viola os meus direitos fundamentais. Estás a gravar sem o meu consentimento só porque eu estou a passar na rua.

M: É por causa do crime, não se pode deixar que eles andem por aí a fazer mal às pessoas.

E: Não se podem justificar acções que violem os direitos das pessoas só com o argumento de que há crime e é para sua segurança. Isso é como a base de dados genética. Há crime, por isso vamos pedir o ADN de toda a gente para identificar os criminosos. Já agora devíamos pedir ao governo para instalar câmaras de vigilância em todas as casas para “prevenir” assaltos.

M: Não sei porque é que estamos a discutir…

E: Tu é que estás a apoiar a ideia, não sou eu. Não sou eu que estou a violar os teus direitos. És tu que estas a violar os meus.

M: …bem, não interessa, é o que eu te disse, é para ficar com imagens dos ladrões, não é com as tuas!

E: Não me digas que também és daquelas pessoas que pensam que as câmaras só se ligam automaticamente quando há um roubo ou quando passa um ladrão, que a câmara descobre por magia….

M: … Olha, isso não interessa.

E: Pois…

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Esta conversa existiu mesmo e tentei reproduzi-la com o máximo de fidelidade embora a ordem de algumas frases possam ter sido, obviamente, trocada. Como registo fica que esta pessoa defende veemente a existência de bilhetes de identidade, não vê problema nenhum com a base de dados genética e concorda plenamente, sem pestanejar, com as políticas de vigilância de Carrilho, sem sequer conhecer os pormenores. Para ela, o Big Brother é um programa de televisão. Falar de George Orwell e de 1984 é como discorrer acerca do tipo de radiação de que as moléculas necessitam para alterar o seu estado de energia. No entanto, é absolutamente contra o porte de arma sem que esteja permitido e registado pelo Estado. Curioso que se defenda simultaneamente a invasão do direito da privacidade (filmar a pessoa) e proibir ao mesmo tempo o uso de uma arma, mesmo quando há uma diferença enorme entre 3 segundos e 20 minutos, o que a torna esta pessoa numa defensora acérrima do estatismo na sua pior forma.

Que também fique para o registo. Esta pessoa define-se politicamente como “de direita” (seja lá o que isso for). Defende ocasionalmente Salazar e a Mocidade Portuguesa, critica frequentemente o 25 de Abril e a “liberdade” e assume posições racistas ou xenófobas quando é conveniente. Fala mal dos comunistas. De facto, por defender a liberdade, tanto económica como de expressão, etc. já foi etiquetado mais do que uma vez de comunista por esta pessoa, o que é deveras interessante. Um marxista como eu a defender a burguesia. Imagine-se....

Em resumo, é uma mistura de estatismo, intervencionismo e autoritarismo na sua pior forma. Alguém que podia ser amigo de Hitler, Salazar, Mussolini ou mesmo Estaline. Tudo socialistas da pior espécie.

A conclusão de tudo isto é, de que adianta termos um blogue com tanta informação se quem o lê são os que concordam connosco, enquanto os palermas da sociedade que andam por aí não se importam de todo? E se aparecem por aqui ainda se põem aos insultos porque atacar o estatismo é como chamar a mãe deles para a conversa.

É durante conversas como esta que a moral vai abaixo. E infelizmente, sair à rua ou falar com gente em Portugal, implica 99,999% das vezes esbarrar com este tipo de pessoas.

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