Não sendo socialista, nunca tive qualquer espécie de apreço por José Sócrates, até mesmo antes de este ter vencido as eleições legislativas em 2005 com maioria absoluta - e, ao contrário de muita gente que conheço, nunca o omiti. Não é que pessoalmente condene os 1,6 milhões de votos que o PS obteve nas eleições de passado Domingo: devido ao simples facto de existirem, todos os seres vivem inevitavelmente em sofrimento (estejam ou não aptos para o reconhecer) e este sofrimento tende a manifestar-se através do materialismo, um apego pouco saudável à circunstância presente e ao efémero. Dois dos sintomas mais comuns desta condição, a ganância e a inveja, são, por conseguinte, duas das maiores armas do socialismo, sendo estas emoções exploradas ao máximo pelos socialistas por forma a alcançar e reforçar o poder que detêm sobre a sociedade.
No entanto, aquilo que me parece verdadeira e inteiramente deplorável é o que se segue à queda de um ídolo. Tal como não há qualquer honra em pontapear um adversário derrotado e indefeso, há poucas coisas mais vis do que mudar de camisa quando a nossa equipa começa a perder. Isto mostra que, ao contrário do que sugeriu e indiciou no passado, a pessoa que o faz não tem valores, princípios ou crenças. Juntou-se àquele grupo meramente porque era o dos vencedores, não porque pessoalmente acreditasse ou se visse reflectida nos seus métodos e objectivos. Acima de tudo, indica que, no futuro, quaisquer opiniões políticas ou apoios anunciados não podem ser tomados como sinceros porque as pessoas em causa já demonstraram não ter causa para além da sua própria.
Para ver excelentes exemplos deste género de comportamento, basta observar as declarações críticas relativamente a Sócrates que desde final de Março, quando o primeiro-ministro anunciou publicamente a sua demissão, têm vindo a brotar como cogumelos. Freitas do Amaral, por exemplo, descobriu (finalmente) no passado mês de Abril que Sócrates estava a viver num mundo irreal, e em Maio que Sócrates tem "pouca cultura democrática" e prestou um mau serviço a Portugal por ter retardado o pedido de resgate financeiro. José Miguel Júdice também parece ter descoberto subitamente, já depois das eleições, que Sócrates terá sido um bom governante até 2008 e só depois começou depois a cometer "erros estratégicos e tácticos" que o tornaram num dos políticos mais odiados do país. Pessoas como Fernanda Câncio já se sentem à vontade para dizer que o Câmara Corporativa, o blogue dos adjuntos do governo, é "uma porcaria de blogue". Luís Amado - que em 2009 falava sobre o fracasso da "ideologia neo-liberal" - teve um momento de inspiração divina e defendeu esta semana que a economia portuguesa necessita mesmo é de um "choque liberal". Isabel Pires de Lima declarou, também esta semana, que este governo desvalorizou a cultura e que esta não foi politicamente apoiada nestes últimos seis anos, entre outras críticas.
Apesar de todos estes casos e de as generalizações serem sempre injustas, os piores desta categoria são, sem dúvida, os jornalistas, que após a demissão de Sócrates e a sua progressiva queda nas sondagens, culminando no já famigerado discurso de derrota, começaram finalmente a encostá-lo às cordas, depois de 6 anos de transigência vegetativa em que os que tiveram a coragem para executar de forma séria aquilo que a sua profissão precisamente lhes exige - questionar o poder - se contaram pelos dedos de uma mão.
Adenda (13 de Junho): Mais uma.
2 comments:
post muito interessante.
Agradecido :)
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