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Thursday, October 22, 2009

O estranho caso da amnésia histórica



No ano em que se comemoram 20 anos da queda do muro de Berlim e do início do colapso da União Soviética, é sempre interessante observar o tipo de afirmações que os militantes de um partido assumidamente estalinista (talvez a recusa da tecnologia capitalista os tenha impedido de receber o memorando de Khrushchev), que recebe organizações terroristas e que está associado a tantas outras actividades e ideais nobres vão fazendo na ocidental praia lusitana. Rita Rato, a nova deputada do PCP na Assembleia da República - e que aparentemente tem formação superior em ciência política e relações internacionais - fez as seguintes e curiosas declarações:
Foi esse o caso da deputada Rita Rato, do PCP, em entrevista à revista ‘Domingo’, do CM, publicada na última edição. O que pensa a deputada dos campos de trabalho forçados na URSS, vulgo ‘Gulag’, em que morreram milhares de pessoas? "Não sou capaz de responder porque, em concreto, nunca estudei nem li nada sobre isso." Bom, mas a coisa foi bem documentada pela História, pergunta--se. "Por isso mesmo, admito que possa ter acontecido essa experiência... Aqui chegados, é melhor parar o baile. Falar de "experiência" quando se fala do ‘Gulag’ é a mais recente versão de negação histórica.
É realmente interessante chamar aos campos de concentração soviéticos, uma das criações mais mortíferas de Estaline, uma "experiência". Mas ao menos a deputada "admite que possa ter acontecido", o que já é certamente um progresso quando se está a falar de centenas de milhares de mortos. Com estes avanços empíricos, talvez uma dia vejamos um membro do PCP a admitir sugerir que, afinal, os elefantes não conseguem voar. O outro caso de relevo foi o do já familiar Bernardino Soares, o deputado que em 2003 verbalizou a sua crença de que o regime mais totalitário à face da Terra provavelmente seria, na verdade, uma "democracia", esclarecendo logo de seguida que, já no caso de Cuba, não existe margem para dúvida de que é realmente uma democracia. Em declarações no programa dos Gato Fedorento, Bernardino Soares disse o seguinte, referindo-se aos regimes comunistas que antecederam o período actual:
"Nós fizemos uma análise crítica desses países e dessas experiências, mas nada disso invalida o facto de serem primeiras tentativas de experiências socialistas e de esse sonho e esse ideal continuar a ter toda a validade, apesar de aquelas não terem corrido muito bem no fim."
Ufa, ainda bem que foram só "experiências" que não "correram bem no fim", ou ainda poderíamos pensar que os mais de 100 milhões de mortos que os regimes comunistas foram acumulando ao longo do último século poderiam ser uma séria fonte de preocupação. Ou que a guerra civil russa (1917-23) que se deu logo após a revolução bolchevique não tivesse feito quase 2 milhões de mortos, e tantos outros refugiados, famintos e afins. Ou que a repressão do regime soviético não tivesse ido subindo de tom até culminar, tão "tardiamente"  - logo na década de 30 - na Grande Purga, em que, num intervalo inferior a dois anos, aproximadamente um milhão de pessoas foi executado, outros tantas centenas de milhares torturadas e deportadas para gulags. Ou que...

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