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Wednesday, October 28, 2009

Diz que é uma espécie de democracia liberal

Um regulador controlado pelo executivo que exclusivamente decide quem tem o direito a transmissões televisivas em sinal aberto. Um tribunal que impede o executivo de atribuir mais licenças:
Graças a esta decisão judicial, da qual a empresa foi notificada esta terça-feira, «o Estado fica proibido de abrir um novo concurso para atribuição de uma licença de televisão para o quinto canal», enquanto não estiver decidida a acção principal.

Recorde-se que tanto a Telecinco como a Zon – os dois concorrentes ao quinto canal – foram excluídas do concurso pela Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC), que entendeu que estas não cumpriam os requisitos necessários para conseguir a licença.
E depois há quem diga que não entende quando se critica a falta de liberdade de imprensa. Mas esta é ainda melhor:
Calendário dita decisões no Banco de Portugal, CMVM, ASAE e em empresas como EDP e Galp.

A coreografia está a cargo do novo Governo de José Sócrates e entre os bailarinos haverá os que transitam da anterior peça e as novidades que ganham um lugar novo. Por caprichos de calendário, até ao final do seu mandato, o primeiro-ministro terá, pelo menos, 19 altos cargos no Estado, ou na sua dependência, para escolher, sem contar com os 390 dirigentes superiores que caem obrigatoriamente com a tomada de posse de um novo Governo e terão que ser reconduzidos ou substituídos.

Há lugares importantes para preencher com nomes de total confiança política, entre eles o de governador do Banco de Portugal, presidente da Comissão de Mercado de Valores Mobiliários ou presidente da RAVE - Rede Ferroviária de Alta Velocidade, o organismo responsável por todo o projecto do TGV liderado por Luís Pardal, que termina o mandato no final deste ano.
Portugal dava um case study espectacular sobre separação de poderes.

Tuesday, October 27, 2009

A nova caça às bruxas

Os povos mediterrânicos têm fama de ser bisbilhoteiros, mas é num país nórdico que surgem ideias brilhantes como esta:
IT'S THE moment nosy neighbours have been waiting for – the release of official records showing the annual income and overall wealth of every Norwegian taxpayer. In a move that would be unthinkable in most countries, tax authorities in Norway have issued the skatteliste, or "tax list," for 2008 to domestic media under a law designed to safeguard the country's tradition of transparency.

The annual list includes data about fishermen on the western fjords, Sami reindeer herders in the north and urbanites in Oslo. To non-Scandinavians, it appears to be a gross violation of privacy. At home, it has stirred up a media frenzy, with headlines revealing who is oil-rich Norway's wealthiest man, woman and celebrity couple.
Vale a pena ler o resto da notícia, em especial para ler o tipo de contexto surrealista em que tudo isto se enquadra, mas esta secção em particular merece destaque prioritário:
Defenders of the system say it enhances transparency, which is essential for an open democracy. "Isn't this how a social democracy ought to work, with openness, transparency and social equality as ideals?" wrote Jan Omdahl, a columnist for the tabloid Dagbladet.
Este é um argumento deveras extraordinário. Se eu fosse conselheiro do governo norueguês, proporia de imediato que fossem efectuadas fotografias digitais de corpo inteiro, em alta definição, a todos os noruegueses e norueguesas, e que estas fossem todas colocadas num portal publicamente acessível, em conjunto com todos os dados que permitissem identificar e localizar cada uma dessas pessoas. Desta forma, toda os machos e fêmeas noruegueses poderiam evitar a total ineficiência que é, no momento presente, cortejar espécimenes do sexo oposto que não sejam dignos de transmitir os seus preciosos genes às gerações seguintes. Claro que a pintura só ficará completa com perfis psiquiátricos, genéticos, de personalidade e de inteligência, mas não sejamos demasiado apressados. Não é tudo isto que se pretende numa sociedade transparente e democrática, onde ninguém tem nada a esconder? Parece o Paraíso na Terra.

A parte mais irónica é que, apesar de tanta conversa fiada sobre vontade democrática, igualdade e abertura social, o apoio popular a esta medida parece denotar uma oposição definida de quase metade da sociedade:
A 2007 survey by research group Synovate revealed that only 32 per cent of the Norwegian public wanted the tax list published, while 46 per cent were against it.

Monday, October 26, 2009

Salazarismo

Para futura referência, especialmente quando alguém disser que Salazar era de "direita":
"A economia liberal que nos deu o super-capitalismo, a concorrência desenfreada, a amoralidade económica, o trabalho-mercadoria, o desemprego de milhões de homens, morreu já."
A frase (via Blasfémias) foi pronunciada no I Congresso da União Nacional, em 1934.

Thursday, October 22, 2009

O estranho caso da amnésia histórica



No ano em que se comemoram 20 anos da queda do muro de Berlim e do início do colapso da União Soviética, é sempre interessante observar o tipo de afirmações que os militantes de um partido assumidamente estalinista (talvez a recusa da tecnologia capitalista os tenha impedido de receber o memorando de Khrushchev), que recebe organizações terroristas e que está associado a tantas outras actividades e ideais nobres vão fazendo na ocidental praia lusitana. Rita Rato, a nova deputada do PCP na Assembleia da República - e que aparentemente tem formação superior em ciência política e relações internacionais - fez as seguintes e curiosas declarações:
Foi esse o caso da deputada Rita Rato, do PCP, em entrevista à revista ‘Domingo’, do CM, publicada na última edição. O que pensa a deputada dos campos de trabalho forçados na URSS, vulgo ‘Gulag’, em que morreram milhares de pessoas? "Não sou capaz de responder porque, em concreto, nunca estudei nem li nada sobre isso." Bom, mas a coisa foi bem documentada pela História, pergunta--se. "Por isso mesmo, admito que possa ter acontecido essa experiência... Aqui chegados, é melhor parar o baile. Falar de "experiência" quando se fala do ‘Gulag’ é a mais recente versão de negação histórica.
É realmente interessante chamar aos campos de concentração soviéticos, uma das criações mais mortíferas de Estaline, uma "experiência". Mas ao menos a deputada "admite que possa ter acontecido", o que já é certamente um progresso quando se está a falar de centenas de milhares de mortos. Com estes avanços empíricos, talvez uma dia vejamos um membro do PCP a admitir sugerir que, afinal, os elefantes não conseguem voar. O outro caso de relevo foi o do já familiar Bernardino Soares, o deputado que em 2003 verbalizou a sua crença de que o regime mais totalitário à face da Terra provavelmente seria, na verdade, uma "democracia", esclarecendo logo de seguida que, já no caso de Cuba, não existe margem para dúvida de que é realmente uma democracia. Em declarações no programa dos Gato Fedorento, Bernardino Soares disse o seguinte, referindo-se aos regimes comunistas que antecederam o período actual:
"Nós fizemos uma análise crítica desses países e dessas experiências, mas nada disso invalida o facto de serem primeiras tentativas de experiências socialistas e de esse sonho e esse ideal continuar a ter toda a validade, apesar de aquelas não terem corrido muito bem no fim."
Ufa, ainda bem que foram só "experiências" que não "correram bem no fim", ou ainda poderíamos pensar que os mais de 100 milhões de mortos que os regimes comunistas foram acumulando ao longo do último século poderiam ser uma séria fonte de preocupação. Ou que a guerra civil russa (1917-23) que se deu logo após a revolução bolchevique não tivesse feito quase 2 milhões de mortos, e tantos outros refugiados, famintos e afins. Ou que a repressão do regime soviético não tivesse ido subindo de tom até culminar, tão "tardiamente"  - logo na década de 30 - na Grande Purga, em que, num intervalo inferior a dois anos, aproximadamente um milhão de pessoas foi executado, outros tantas centenas de milhares torturadas e deportadas para gulags. Ou que...