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Saturday, August 26, 2006

Tempos de escola

Os choques ideológicos entre os que defendem a paz e os que dizem defender a paz no contexto internacional recordam-me da analogia quase equivalente que é desenhada através do ambiente de escola primária. Também lá, à semelhança do mundo político, há os proselitistas da não-violência, coisa que apenas se parece aplicar aos que respondem a uma agressão iniciada por outrem. Esta justificação baseia-se no conceito de que responder a violência com violência apenas gera mais violência que, claramente, não pode ser classificado de pacifista. Um pacifista defende que tem de existir paz e se existe uma iniciação de força inicial então o que se está apenas a defender é que alguém tem de prescindir do seu direito de resposta quando é agredido.

Esta filosofia de vida é defendida sobretudo pelos professores e dirigentes, que não querem que os pátios das suas escolas se transformem num ringue de boxe a cada intervalo. Com esta ideia em mente, pedem sempre aos seus alunos que reportem qualquer incidente grave, como uma violação da integridade física, ao professor respectivo ou ao director de turma. Claro que, por duas razões, isto apenas serve para propagar a violência. A primeira é pelo facto de os professores não fazerem nada quando a queixa lhes chega às mãos. O mais provável é que seja preenchido um papel com um registo de mau comportamento que entretanto se perde nos arquivos da secretaria. Se se voltar a repetir várias vezes, talvez o jovem problemático - com certeza um resultado da sua condição social (como se todos os pobres fossem criminosos) ou por ser de uma minoria étnica (como se a cor da pele fosse legitimidade para violar direitos alheios) - seja suspenso. Uns 3 dias, talvez. Depois volta à carga. E, entretanto, o rapazito que fez a queixa leva mais umas biqueiradas, que é para aprender a não abrir a boca quando não deve. A segunda razão é o incentivo que é cedido ao agressor. Ao permitir que este detenha o controlo psicológico total sobre a pessoa que deseja intimidar, ele sentir-se-á mais forte e terá um encorajamento moral para continuar ou agravar a agressão. Se a vítima der sintomas de reacção, é provável que da próxima vez o violento fanfarrão pense duas vezes. Ou então que não exagere nos conflitos, caso contrário arrisca-se, ele também, a levar uns hematomas para casa.

A posição contrária é a geralmente defendida pelos pais. Esses dizem sempre aos filhos que se defendam com os punhos e respondam. Olho por olho, dente por dente, como no Antigo Testamento. Os professores são os mensageiros da Boa Nova, que dizem para oferecer a outra face. É pena que os ensinamentos de Cristo de pouco sirvam para situações não metafóricas. É possível que haja dissonância entre a opinião da mãe e do pai, pondo-se esta do lado da posição ética dos professores e preservando a faceta ingénua do seu filho, pedindo-lhe que conte toda a situação a um adulto, iludida pela ideia de que alguém pode fazer mais pela segurança do seu filho do que ele próprio. Os pais, os machos-alfas sobrecarregados de testosterona e de pouca paciência, aconselham de imediato que se responda com uma chapada na tromba.

Tendo em conta como é o mundo selvagem das escolas públicas em Portugal (como no caso americano/inglês, em que o bullying é um fenómeno socialmente reconhecido), a estratégia geopolítica e os assuntos de relações internacionais acabam por ser demasiado semelhantes a todo este panorama frequentemente constatável no caso acima descrito. Há sempre alguém que pede muito histericamente aos gritos que a briga pare, mas, obviamente, sem se meter no meio, ou ainda se arrisca a levar um pontapé em partes menos aconselháveis. Há sempre alguém que gosta de ir lá para dar uns açoites valentes naquele tipo que está no chão e agora permanece completamente indefeso, coisa que nunca faria numa situação de desvantagem. Há sempre alguém que diz que ajuda quando não está directamente envolvido no problema mas quando chega a altura certa, foge com o rabo à seringa. Descobre-se a linha ténue entre os verdadeiros amigos e aqueles que falam muito mas actuam substancialmente menos.

No final, acaba sempre alguém com os dentes partidos, seja ele a vítima inicial do conflito ou o agressor a quem é necessário dar individualmente uma lição para pôr término ao abuso constante que apenas continua se não houver uma reacção significativa. Assim como em guerras de âmbito internacional.

Thursday, August 24, 2006

All your planets™ are belong to us

Parece que a IAU decidiu finalmente que Plutão não é um planeta mas sim um anão de segunda classe. Na CNN discutia-se se isto teria efeitos psicológicos irreversíveis a longo prazo para pobre Plutão. Ao mesmo tempo, uma pessoa perguntava-me, muito preocupada, se Plutão iria deixar de existir e o que iam fazer agora que o planeta tinha desaparecido.


Tuesday, August 22, 2006

Globalisation is good

«The world is an unequal and unjust place, in which some are born into wealth and some into hunger and misery. To explore why, in this controversial Channel Four documentary the young Swedish writer Johan Norberg takes the viewers on a journey to Taiwan, Vietnam, Kenya and Brussels to see the impact of globalisation, and the consequences of its absence. It makes the case that the problem in the world is not too much capitalism, globalisation and multinationals, but too little.

"Globalisation is good" tells a tale of two countries that were equally poor 50 years ago - Taiwan and Kenya. Today Taiwan is 20 times richer than Kenya. We meet the farmers and entrepreneurs that could develop Taiwan because it introduced a market economy and integrated into global trade. And we meet the Kenyan farmers and slum dwellers that are still desperately poor, because Kenya shut its door to globalisation. The Kenyans are suffering from regulations, corruption and the lack of property rights. The unequal distribution in the world is a result of the unequal distribution of capitalism - those who have capitalism grow rich, those who don't stay poor.»





[O mesmo documentário disponível em castelhano]

Monday, August 21, 2006

As leis laborais nas sondagens

O Financial Times publica hoje uma sondagem sobre a actual opinião de alguns europeus relativamente às leis laborais. Alemães e franceses, com uma percentagem de desempregados por volta dos dois dígitos, parecem estar mais receptivos à liberalização do número máximo de horas de trabalho exigidas por lei. O caso francês é crónico - a própria introdução do CPE era já uma medida meio-desesperada na tentativa de cortar um dado estatístico estagnado que ronda os 10% há aproximadamente 30 anos:

«Some 65 per cent of Germans and 52 per cent of French oppose government controls on working hours, according to a Financial Times/Harris poll that interviewed almost 10,000 people over 16 in Britain, France, Germany, Italy and Spain. (...)

Unemployment in Germany and France in recent years has been running at twice the British rate. This has prompted some politicians to question the effectiveness of highly protective labour regulations in the two countries, compared with the more liberal Anglo-Saxon model.»

Os resultados gerais estão resumidos no seguinte gráfico:

Sunday, August 20, 2006

Self-loathing II

«Alberto João Jardim admite, sim, que alguns investimentos terão de ser adiados. "Tem de haver uma outra engenharia financeira e lançar os investimentos de 2006 para 2007, os desse ano para 2008 e assim sucessivamente, mas os socialistas defendiam que eu devia lançar e aumentar impostos", realçou

Saturday, August 19, 2006

Combate à fuga da fuga

Tem sido sugerido constantemente na comunicação social que a decisão do governo em divulgar listas de contribuintes devedores ao fisco e à segurança social se faz no âmbito do combate à fuga fiscal. Uma conclusão muito curiosa e interessante se tivermos em conta que se supõe que as pessoas e empresas que aparecem nestas listas não cumpriram as suas obrigações, numa tentativa de fuga deliberada à tributação, com a esperança óbvia de não serem detectadas ou indiciadas pelo seu acto.

Mais natural é que os devedores experientes - os que mais temem ser apanhados, os que não confiam tanto na boa vontade dos burocratas ou suspeitam da possibilidade de serem descobertos por entre os dados estatísticos recolhidos - não arrisquem e façam o trabalho de um profissional. Estes certamente não fornecerão ao Estado qualquer informação que se possa virar contra si mesmos e que os possa prejudicar de futuro. O crime perfeito é sempre aquele que não deixa marcas formais ou aquele em que o criminoso usa o próprio sistema de detecção de crimes para seu próprio proveito, seja subornando um responsável, encontrando conveniências mútuas ou explorando falhas sistemáticas.

Os devedores que se encontram listados não fazem parte deste grupo porque se a acção fosse efectivamente intencional e tivessem tomado essas precauções, não estariam a braços com esta situação. A publicação das listas visa, portanto, os que foram suficientemente ingénuos para julgar que não seriam apanhados. O que a ideia de que a medida se insere no combate à fuga fiscal não analisa é o facto de que aqueles que já arriscam ser apanhados de qualquer das formas, ao permitir que o Estado registe provas das suas faltas, apenas ganharão um incentivo maior para recorrer a técnicas mais eficazes de subterfúgio e que permitam em simultâneo reduzir de forma significativa o seu risco de ser descobertos a longo prazo. A publicação destas listas é, portanto, um encorajamento à mudança destas pessoas do grupo dos que visivelmente actuam de forma ilegal para os que cometem ilegalidades mas dão uma aparência de legalidade absolutamente transparente.

Um bom exemplo dos efeitos deste género de perseguição fiscal é o súbito desaparecimento do número de contribuintes registados em escalões elevados do IRS, à medida que as respectivas taxas têm vindo a aumentar.

Friday, August 18, 2006

Lei da inércia mental

Dos boatos às ilações, o Saboteur sugere que possam ser os modelos físicos e matemáticos a derradeira explicação para a heresia capitalista que por aqui se comete. De onde vem esta súbita e peregrina relação causa-efeito? É que tanto quanto esta ciência do oculto e adivinhação permite concluir, talvez seja a opinião sobre Majorana um perigoso resultado proveniente de alguma duvidosa análise de custos de oportunidade e elasticidade de preços. Nestas coisas nunca se sabe e, pela via das dúvidas, possivelmente é melhor dar razão a quem não é suspeito de cooperar com a liberdade económica.

Por exemplo, a teoria da conspiração sobre os físicos, os matemáticos e as elites capitalistas é muito interessante. Mas está fundamentada em quê, exactamente? No perigoso e neoliberal teorema fundamental da álgebra? No facto de a lei da oferta e da procura ser proto-fascista e não ter lugar no modelo padrão de partículas e forças fundamentais? No de que a lei da gravitação universal é reaccionária e não há razão pela qual lhe devemos obedecer?



Aguardam-se novos desenvolvimentos neste magnífico campo de investigação multidisciplinar que pouco tem que ver com o uso real de física estatística e outras conclusões sobre processos considerados estocásticos em economia.

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Nota: Saboteur, veja lá se resolve as suas desavenças com o problema filosófico com que deseja atacar as minhas opiniões. Primeiro era o modelo neo-clássico porque eu era economista, agora é a formulação matemática e teórica porque sou físico. Será amanhã a teoria geral do direito civil e a jurisprudência porque sou advogado e estes são evidentes servos do grande capital? E para mais, como resolvemos este enigma económico? E este, que parece ainda não ter tido uma resposta concreta?

Nota 2: O Filipe Moura e o establishment científico de (extrema-)esquerda devem ser uma conspiração da CIA.

Wednesday, August 16, 2006

Remar contra a maré

Consta que o meu pequeno apontamento sobre a absurdidade das últimas propostas relativamente ao affair Ettore Majorana foi referido na secção de ciência do Público e que o autor de tal proeza foi nada mais nada menos do que o Filipe Moura. Obviamente que agradeço e até reconheço a honestidade profissional em questão, tendo em conta a extrema importância que o Filipe parece querer dar ao facto de por aqui se partilharem visões antagónicas de política/economia. Contudo, o Filipe Moura publicou hoje o artigo no blogue e parece querer também provar alguma coisa no que diz respeito ao que tem andado a ser discutido sobre a Dia D nos últimos dias.

No que toca à Dia D propriamente dita, deveria ser do conhecimento geral que as entidades responsáveis pela sua publicação são privadas (Público/Money Media) e, como é óbvio, devem ser elas a decidir qual a linha editorial que desejam seguir, uma vez que não estão obrigadas a ser condescendentes com as tendências de opinião das outras publicações, nem os textos pessoais de cada um dos colaboradores vinculam a revista no que toca às suas posições particulares.

Felizmente, não parece existir uma comissão central que decida o plano estratégico a executar, nem quais as quantidades de cada ração opinativa a distribuir por unidade geográfica de distribuição jornalística, proveniente de cada autor, de acordo com a sua habilidade, e para cada um dos leitores, de acordo com a sua necessidade. Reconheço que é incómodo, fica tudo mais contra-revolucionário e difícil de gerir a partir de um gabinete que supostamente teria controlo sobre todas as decisões. Ainda assim, certamente que o Filipe não nos vê a criticar o facto de publicações de cariz privado como o Avante! (irónico, não?) não terem nas suas colunas a opinião de um insurgente ou blasfemo em vez destes elogios destacados a Fidel Castro. Semelhante observação é absolutamente válida para tantas outras revistas independentes e com total exclusividade sobre os seus próprios conteúdos, que são precisamente o fruto desta multiplicidade de centros de decisão gerada pela combinação entre a liberdade de imprensa e a detenção da propriedade privada sobre estes mesmos meios.

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1. Quanto ao à ironia do João Miranda, não me parece que a menção do artigo sobre Majorana seja de todo relevante porque, quando muito, tal coisa só serve para demonstrar que fazia sentido. De acordo com os parâmetros estabelecidos pelo comentário do João, nenhuma das secções é propriamente pluralista, verificando-se ciência credível de um lado e economia credível do outro. Não vejo que tenha sido uma piada demasiado complexa.

2. O AAA tomou o cuidado de reproduzir um comentário meu feito nas caixas d'O Insurgente que resume o que penso acerca da situação e das acusações de falta de pluralismo. Verdade seja dita, se a Dia D é pouco pluralista, que dizer de canais como a RTP, que se trata supostamente de uma estação pública directamente financiada com os impostos dos contribuintes portugueses? (ao contrário da Dia D, que decerto está infinitamente mais dependente do seu sucesso no mercado). Curiosamente, vê-se pouca gente a incomodar-se com isto, tirando as pessoas do costume e aqueles que julgam que esta devia ser ainda menos pluralista.

3. Para além de ficar por explicar como é que um "antiesquerdista primário" tão exacerbado pode frequentar um curso que dá pelo pouco sugestivo nome de ... LEFT, como estagiário de jornalismo no Público, talvez fosse boa ideia desenvolver a saudável prática de obter uma certificação sólida para as alegações feitas, sustentada em fontes credíveis, em vez de as passar como informação sem confirmação. Já para não dizer que mentir é feio.

Plutão aguarda impaciente

Tuesday, August 15, 2006

Testemunhos de quem lá esteve

Uma recomendável, embora longa (46 minutos), entrevista com esta Brigitte Gabriel a que o Adolfo faz referência. Sobre a guerra civil libanesa e Israel:


As empresas são diabólicas

Dell recalls 4m laptop batteries
«The world's largest manufacturer of personal computers, Dell, is to recall 4.1 million of its notebook computer batteries because of a fire risk. (...)

Dell says it knows of six instances since December when the batteries, made by Sony, overheated or caught fire.

(...)

"In rare cases, a short-circuit could cause the battery to overheat, causing a risk of smoke and or fire," said Dell spokesman Ira Williams.

"It happens in rare cases but we opted to take this broad action immediately."

Dell plans to launch a website telling customers how to get a free replacement battery, the Associated Press news agency reports.»

Monday, August 14, 2006

A guerra de 1908

- Estabelecer uma hora, calculada de acordo com o Observatório de Greenwich para o fim das salvas de rockets/acções terrestres em ambas as partes e para dar início a um cessar-fogo mútuo;

- Criar uma resolução do conselho de segurança da ONU em muito semelhante à tal 1559 do ano 2004, que nunca foi cumprida, "apelando" ao desarmamento do Hezbollah;

- Ter o governo francês a ser absolutamente original, dizendo que a solução para o desarmamento do Hezbollah é política/diplomática e não militar;

- Determinar que o governo libanês (o tal que vê o Hezbollah como um grupo de resistentes em luta pela sobrevivência libanesa) e a UNIFIL (uma organização a mando dos anteriores cujos propósitos nunca são cumpridos) devem deter o controlo de facto da zona sul do Líbano.

- Imaginar que as hostilidades deste conflito ficaram resolvidas.

Sunday, August 13, 2006

Preocupante

O Sapo criou este blog acerca de Cuba e nele decorre uma votação sobre El Comandante. O problema não é a votação em si, nem as ligações (Juventude Rebelde, Granma, etc), mas a pergunta, que nos pede para determinar se Fidel Castro é um ditador ou um democrata. Surpreendentemente, 3/4 da amostra sondada - quase 4000 pessoas até ao momento - responderam que Fidel Castro é um ditador. Como não deve ser difícil de imaginar, o principal obstáculo à existência de democracia em Cuba é precisamente o facto de tanta gente ter atitudes mal-intencionadas deste género e responder o oposto da realidade só para denegrir internacionalmente a imagem de Fidel. Lamentável.

Créditos: Adobe® Photoshop® CS2




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Adenda: Comentário no blogue de Johan Norberg.

Recomendações

As esquerdas anti-semitas (Vasco Graça Moura)

A génese do holocausto e A balança da liberdade (Mário Chainho) [a propósito deste último texto, consultar a versão em cartoon da obra The Road to Serfdom de F.A. Hayek]

Fidelíssimos e Os antigos radicais (Fernando da Cruz Gabriel)

Os vários episódios da série Free to Choose de Milton Friedman (via Greg Mankiw) e um vídeo dos anos 40 sobre as diferenças entre o capitalismo e o comunismo (via The Austrian Economists)

Impacto económico das nossas insuficiências educativas (João César das Neves) e La sociedad de deseño no funciona (Jorge Valín), sobre educação.

Os artigos de Paul Belien no The Brussels Journal sobre as tentativas de amordaçar a liberdade de imprensa e ilegalizar o ensino à distância por parte do Estado belga.

Saturday, August 12, 2006

Walid Shoebat e Zachariah Anani

Vários vídeos com Walid Shoebat e Zachariah Anani (ex-terroristas da OLP e [correcção: Fatah] milícias islâmicas libanesas, respectivamente) a ver na totalidade, embora algumas declarações e informações sejam repetidas. Os primeiros são descrições sobre o funcionamento interno das organizações terroristas a que pertenceram, as suas experiências pessoais e as dificuldades trazidas pelas suas apostasias. Os últimos, entrevistas na CNN e na Fox News sobre o conflito entre Israel e o Hezbollah.



[Actualização: N'O Insurgente, um vídeo com uma entrevista simultânea a Walid Shoebat, Zachariah Anani e Ibrahim Abdullah (ex-Fatah) que resume muito bem a maioria da informação presente nos restantes vídeos]













Friday, August 11, 2006

Confusões perigosas

Uma discussão política ou económica com um opositor declarado das ideias liberais acaba quase sempre com um assunto relacionado com os EUA em cima da mesa, seja sobre a visão da política externa americana ou uma qualquer prática corrente a nível interno. Isto acontece porque muita gente confunde os EUA com liberalismo e/ou capitalismo, o que, para além de absolutamente errado, é muito perigoso. Não só os Estados americanos (locais e federal) e a linha política seguida pelo seu governo não devem ser considerados liberais no sentido avançado pelo liberalismo clássico, como o liberalismo não pode - nem deve - servir como ideologia/filosofia justificativa para qualquer que seja a acção tomada pelo governo americano, flexibilizando-se à medida dos caprichos do Congresso, do presidente ou dos secretários de Estado.

É por isso evasivo e irrelevante, para uma discussão honesta, atacar os argumentos de alguém utilizando como forma de contestação qualquer prática promulgada pelo governo americano, independentemente da área legal, e que seja supostamente reveladora de uma contradição ou incoerência. Para que isso fosse possível, os proponentes de um regime (mais) liberal teriam de permanecer totalmente acríticos face à atitude governamental americana, o que geralmente não é verdade. O oposto seria horrivelmente insalubre.

Quem confunde estes dois aspectos sofre de uma síndrome própria de "Guerra Fria retrospectiva", em que o mundo é a preto e branco, e apenas se pode escolher um país para apoiar entusiasticamente, sem contestação, não sendo permitido sequer o mínimo de espaço para o designar de "mal menor" ou propor dissidências de opinião. Ao contrário de Estados publicamente reconhecidos como socialistas/comunistas, tanto pelos seus dirigentes como pelos seguidores da religião, não existem Estados liberais que sugiram um modelo inquestionável a seguir. E isto sucede porque, para o que talvez perfaz a maioria, nenhum Estado existente na actualidade é, por definição, totalmente liberal (como em governo limitado ou estado mínimo) ou é reconhecido como tal. A incidência do liberalismo sobre a política é presentemente sentida mais como uma questão quantitativa do que propriamente qualitativa, e assim se podem classificar Estados mais liberais e outros menos liberais, consoante o grau de liberdade que concedam aos seus habitantes. Para desespero dos mais necessitados de um manual de instruções, o liberalismo é algo que não apresenta um tomo sagrado que seguir de acordo com regras ortodoxas, nem os próprios liberais com frequência se entendem mutuamente sobre quais devem ser os limites impostos. Em contraposição ao outro extremo do espectro político, não se daria qualquer purga ideológica, por razões mais que evidentes.

Não existem necessariamente modelos para uma sociedade liberal. E isto não é um erro de arquitectura. O modelo das sociedades mais liberais é propositadamente emergente da ausência total ou presença muito mitigada de planeamento centralizado, uma vez que se reconhece, deontológica ou consequencialmente, que este planeamento ou é sempre mau ou, na maior parte das vezes, causa mais estragos do que os já naturalmente verificados, descontando o efeito negativo que a própria intromissão estatal possui. A melhor prova experimental deste facto é o reconhecimento feito pelos socialistas mais realistas (os sociais-democratas) de que o formato político mais socialmente eficiente e menos humanamente desastroso encontrado é a democracia liberal, por contraste à economia planeada e à legitimidade estatal para negar os direitos civis dos indivíduos consoante o rumo da conjuntura política.

Thursday, August 10, 2006

Paradoxo da semana

Um negro naturalizado, cuja língua materna é tudo menos lusófona ou galaica, está a pôr os patriotas portugueses absolutamente extáticos pelo facto de competir com um fato verde-rubro e pegar numa bandeira das quinas no final das suas vitórias. Moral da história: só se é nacionalista anti-estrangeiro e defensor da pureza da raça quando dá jeito ou não se ganham medalhas de ouro.

A GB é território ocupado



As restrições de segurança ainda se mantêm mas parece que os freedom fighters do dia não foram bem sucedidos.

Então e a proporcionalidade?

Em Cuba não há liberdade de imprensa. Não podem ser feitas emissões de canais adversos ao regime.
Em Cuba não há liberdade de imprensa. Não podem ser feitas emissões de canais adversos ao regime.

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Os americanos querem invadir Cuba! Todos solidários em nome da soberania do povo cubano!
Os americanos querem invadir Cuba! Todos solidários em nome da soberania do povo cubano!

Wednesday, August 09, 2006

Self-loathing

O mundo está cheio de perigosos islamófobos racistas. Eles andem aí.

Como criar uma ditadura

O poder é algo de verdadeiramente fascinante, especialmente quando se doutrinam educam os eleitores indefinidamente e se vai acomodando a lei para permitir os tais 25 anos de poder:

El régimen chavista está formando “brigadas revolucionarias infantiles”, y el plan se inscribe dentro del proceso de reforma a la educación en Venezuela. El propio Aristóbulo Istúriz, ministro de Educación declaraba el 28 de julio: “Sí estoy politizando la educación, y que?”.

En el marco del III Congreso Pedagógico Nacional, el funcionario declaraba ante miles de educadores que “para cambiar el actual modelo de educación es necesario tener un piso ideológico y político, pues sin política no hay pedagogía y sin ellas no hay educación”.

El Proyecto Nacional de Educación, alentado por Chávez y ejecutado por Istúriz, pretende adoctrinar a las nuevas generaciones sobre la revolución bolivariana, sobre la fórmula de unificar a Sudamérica como un bloque comunista que luche contra el “imperialismo”.
“Ustedes son adoctrinadores del proceso revolucionario (…) Nosotros tenemos que inculcar nuestra doctrina comunista desde las escuelas, hablarles sin temores a nuestros muchachos de socialismo, igualdad y justicia, con los principios que Bolívar nos dejó como herencia”, declaró el funcionario en esa ocasión.

Aristóbulo Istúriz ha venido presidiendo actos con niños y adolescentes escolares disfrazados de rojo, o bien con trajes militares y la mítica boina colorada que acostumbra el teniente coronel Chávez. Algunos de ellos recitan de memoria discursos con vergonzosas expresiones de culto a la personalidad del presidente.

Alerta. Aníbal Romero, profesor de ciencia política de la Universidad Simón Bolívar denuncia que el ministro de Educación, otrora guerrillero urbano con varios secuestros en su haber, “está a la cabeza de un proyecto de control político y adoctrinamiento ideológico que incluye el más amplio y costoso convenio internacional que en torno al tema educativo haya concretado jamás un gobierno venezolano”.

(...)

El ministerio de Educación venezolano ya está promocionando un masivo concurso escolar destinado a promover la admiración de los jóvenes por la figura del Che Guevara. Una enciclopedia escolar para la escuela primaria, distribuida por el gobierno exalta al terrorista venezolano conocido como Carlos, “el Chacal”, así como los esfuerzos de Chávez para liberarle de su prisión en Francia y extraditarle a Venezuela.

Hay otros esfuerzos abiertos, en los que los maestros “revolucionarios” solicitan a los niños que ejecuten como tarea censos en sus vecindarios, dirigidos a averiguar las simpatías políticas de las personas.

Todavía el gobierno de Chávez no ha convertido en leyes sus planes de control y adoctrinamiento educativos, pero el proyecto de “cambio” avanza de forma gradual.
Motivos. El ministro propone un sistema educativo basado en la teoría pedagógica: “El Estado es quien debe formar ciudadanos de acuerdo con su teoría política, de acuerdo a su visión de República”.

“Istúriz se está divorciando de la Constitución que aprobó años atrás, porque pretende que se implante como oficial una ideología política en nuestro sistema educativo”, agrega.

La Constitución establece la prohibición implícita de que la educación se convierta en canal de difusión privilegiada de cualquier doctrina o ideología, de cualquier “ismo”. En el artículo 102 se recalca, en cambio, que ella debe estar “fundamentada en el respeto a todas las corrientes del pensamiento”.

El argumento de los detractores de este giro radical al sistema educativo venezolano advierten que la construcción del Socialismo del Siglo XXI avanza en Venezuela hacia el abismo al que se han dirigido todos los socialismos, y para tener una mayoría de siervos voluntarios que parados ante el abismo, den un paso al frente al grito de ¡ordene comandante! requiere un control completo y eficiente del sistema educativo como herramienta de ideologización socialista.

Monday, August 07, 2006

Idiotice útil

Depois da saga do "massacre" de Qana (2006) que viu subitamente as suas vítimas mortais reduzidas para metade, do "massacre hediondo" de ontem em Beirute, que tinha feito 40 vítimas civis mas hoje só tem apenas 1, e da quantidade escandalosa de fotos adulteradas que a Reuters tem estado a publicar na imprensa internacional, temos sempre as magníficas declarações públicas dessa figura que incorpora o espírito mais idiotarian que existe no Ocidente: George Galloway, o líder do partido britânico Respect.




Os pontos altos do discurso - para além das já tradicionais referências ao Iraque e outros países islâmicos - são:

"Porque todos nós temos o dever de dizer a verdade"

(...)

"O Hezbollah não é, nem alguma vez foi, uma organização terrorista!" (...)

(ovação e gritos frequentes de
Allah Akhbar! [Alá é grande])

"Por fim, digo apenas isto, Hassan Nasrallah [líder do Hezbollah] é o verdadeiro líder do povo árabe! Marwan Barghouti [ex-líder das brigadas mártires de Al-Aqsa, preso perpetuamente em Israel] é o verdadeiro líder do povo árabe! O presidente Nasser [antigo presidente egípcio, ícone do mundo árabe] é o verdadeiro líder do povo árabe! Hugo Chávez e Fidel Castro são os verdadeiros líderes do povo árabe! Vitória à Intifada! Viva a Resistência!
Assalaam Alaikum [a "paz" esteja convosco]"

Para ver outras fotos do protesto em Londres a favor do cessar-fogo incondicional, ver mais informação aqui.

O melhor local do momento para aceder a todas as declarações absolutamente inacreditáveis e outros acontecimentos, como a análise das fotos forjadas, que, por alguma razão suspeita*, não são veiculadas em fontes de informação portuguesas: Little Green Footballs.

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*A informação é de extrema importância; se os meios de comunicação deixam as pessoas propositadamente na ignorância ou as induzem em erro, entram em conflito com as regras definidas pelo seu código deontológico.

Perfect timing

The Noneconomic Objections to Capitalism, extraído da obra The Anti-Capitalistic Mentality de Ludwig von Mises

1. The Argument of Happiness
2. Materialism
3. Injustice
4. The "Bourgeois Prejudice" for Liberty
5. Liberty and Western Civilization

Silly season chega à Física

Físico italiano do início do século 20 esteve «morto» e «vivo» ao mesmo tempo

Para chegar a tal conclusão, o autor do artigo (que certamente não tinha nada de maior utilidade em que gastar os fundos concedidos) sugere que Ettore Majorana, o físico italiano a que se refere a notícia, terá produzido o seu próprio desaparecimento no que seria um teste aos "paradoxos" da mecânica quântica. Explica o artigo da Ciência Hoje:

«O físico teórico Oleg Zaslavskii, da Karazin Kharkiv National University da Ucrânia, sugere agora que esta ambiguidade à volta do seu destino poderá na realidade ser parte de uma ilusão magicada por Majorana para demonstrar a sobreposição quântica. Este paradoxo em que uma partícula pode simultaneamente existir em dois estados quânticos mutuamente exclusivos é exemplificado pelo gato de Schrödinger uma experiência dura em que o gato pode estar vivo e morto ao mesmo tempo.»

O problema está em que Majorana não é uma partícula (nem uma onda de comprimento relevante, ver princípio de De Broglie) e a gedankenexperiment de Schrödinger servia precisamente para demonstrar o absurdo que eram os princípios da mecânica quântica quando aplicados ao nível macroscópico em que a física válida era a newtoniana/einsteiniana, transformando uma previsão científica válida num aparente paradoxo. O gato de Schrodinger estaria simultaneamente morto e vivo - a sobreposição de estados - devido a uma substância radioactiva que tinha 50% de hipóteses de decair, accionando um mecanismo de envenenamento letal do gato.


Esta questão levou a um dos mais intensos debates filosóficos sobre a ciência, ao longo do século XX, com o objectivo de compreender a física quântica, que incluiria temas como o paradoxo EPR, o determinismo (Einstein) vs. a interpretação de Copenhaga (Niels Bohr), as variáveis escondidas, as mais metafísicas e esotéricas propostas da existência de universos paralelos ou multiversos, em que cada um veria diferentes resultados da experiência, e as ainda mais místicas explicações sobre a ligação entre a mente do observador e a interpretação da experiência em si, etc. Tais problemas continuam a ser contestados até à data, não tendo sido esclarecidos nem mesmo com a famosa experiência proposta por John Bell e realizada, nos anos 80, pelo físico francês Alain Aspect, ou outras versões mais contemporâneas. O assunto continua a ser controverso, assim como as desigualdades de Bell e as experiências para as testar, que continuam a ser objecto de forte crítica por falhas sistemáticas que até agora não foram resolvidas, assim como a validade duvidosa do uso de princípios de mecânica quântica quando aplicados à teoria de gravitação.

O que tem tudo isto a ver com Majorana? Aparentemente, Majorana tentou suicidar-se e sobreviver ao mesmo tempo. A menos que o ucraniano Oleg Zaslavskii, autor do artigo em questão, consiga provar que existem universos paralelos ou fornecer qualquer outra explicação científica plausível e falsificável, não se compreende muito bem a razão de tal sensacionalismo jornalístico exposto nos títulos da notícia nem da importância científica (não-histórica) do artigo propriamente dito. É que Majorana pode realmente ter desaparecido devido a uma experiência que realizou para testar "paradoxos" da mecânica quântica mas o facto de não ter voltado para a contar parece revelar que afinal não havia paradoxo algum e o resultado da sua pequena tentativa de suicídio foi apenas um.


Notas:

1. Notícia sobre o mesmo artigo apareceu na New Scientist. Isto é bastante estimulante porque se se quiser propor uma nova teoria vista como heterodoxa é muito difícil encontrar quem publique, devido ao intenso peer review (que não é o caso da New Scientist) ou simplesmente porque parece demasiado arriscado publicar tal coisa. No entanto, se for um artigo, por mais absurdas ou irrelevantes que sejam as conclusões científicas, mas com base na teoria consensual, as facilidades aumentam em grande escala.

2. Claro que segundo a teoria da mecânica quântica existe até uma probabilidade de que Ettore Majorana se tenha dissolvido e aparecido num planeta de outra galáxia. No entanto, como devem imaginar, a probabilidade teórica de tal acontecer é suficientemente próxima de zero para que possamos dormir descansados.

3. O artigo publicado no arXiv (17 páginas) pode ser lido aqui gratuitamente. Nada de fórmulas matemáticas. Também a ler o comentário de Andrew Jaffe e leitores respectivos.

4. Não tem a ver com o tema principal mas passou há dias na 2: um documentário sobre Einstein e a teoria da relatividade, que pretendia ser uma introdução elementar, direccionada a estudantes adolescentes, sobre a relatividade restrita, os seus conceitos e a importância do trabalho de Einstein para o conhecimento actual da física moderna, especialmente nos ramos de física gravitacional. Qual é a relevância de apontar isto? Esse dia foi sexta-feira. Uma sexta-feira do mês de Agosto. E o documentário começou às 3 da manhã. A menos que esteja na esperança de que haja uma terceira chamada para o exame de Física do 12º ano, e uma vez que os interessados têm acesso a coisas de melhor qualidade, poucas chances há de que algum dos elementos do público-alvo estivesse a ver o dito documentário. Ou será que nem existia um público-alvo e esta transmissão e outras semelhantes servem apenas para que o MCTES possa reclamar, em acções futuras, um trabalho magnífico em prol do conhecimento entre as camadas jovens?

5. Quem seguiu alguma das ligações usadas na parte anterior reparará como é cada vez mais difícil viver sem a Wikipédia.

Saturday, August 05, 2006

O verdadeiro terrorismo de Estado

Children of the Secret State é um documentário produzido em 2000 para o Discovery Channel onde podem ser vistos alguns dos contrastes entre as zonas norte-coreanas nas quais os turistas estrangeiros (jornalistas não são autorizados) podem circular "livremente" e aquelas cujo acesso lhes é bloqueado. São também mostrados os verdadeiros fins dos auxílios alimentares que são fornecidos à Coreia do Norte, relatos de tortura, execução, fuga e canibalismo desesperado, assim como de produção de ópio para venda nos mercados internacionais, tendo como principal objectivo a manutenção do status quo das elites do regime. No vídeo podem ser ouvidos comentários de um representante da organização humanitária Action Against Hunger, que retirou as suas ajudas à população (ou melhor, ao partido) e a diferença apresentada pelos refugiados que conseguiram recomeçar as suas vidas na comparativamente capitalista Coreia do Sul ou mesmo na fronteira chinesa.




(Agradecimento à Elise pela ligação)

Friday, August 04, 2006

The truth is out there (reposição)

Uma refutação do socialismo através dos factos. Aqueles mesmos factos que o mundo já aceitou na prática (incluindo a China e a Rússia) mas continua a combater ideologicamente. Um artigo excelente para guardar e mostrar aos amiguinhos marxistas, especialmente aos que procuram erradicar a pobreza.

The Wealth of Generations: Capitalism and the Belief in the Future de Johan Norberg:
What happened was that the proletarians became middle class, and the middle class began to live like the upper class. And the most liberal country, England, led the way. According to the trends of mankind until then, it would take 2 000 years to double the average income. In the mid-19th century, the British did it in 30 years. When Marx died in 1883, the average Englishman was three times richer than he was when Marx was born in 1818.

(...)

Another reason for this happiness is that a liberal and market-oriented society allows people freedom to choose. If we get used to it we will get increasingly better at choosing to live and work in ways we like. And if you don’t think you get happier by hard work and mobility, just skip it. A survey showed that 48 percent of Americans had, in the last five years, reduced their working hours, declined promotion, lowered their material expectations or moved to a quieter place. Fast-food or slow-food, no logo or pro logo? In a liberal society, you decide. That is, as long as we are free to make the decisions ourselves. Those who use happiness studies to put forth an anti-market agenda would deny us that freedom. They would tell us how to live our lives, and therefore they would reduce our ability to make such decisions in the future.

[Outubro de 2005]

Tigre celta


The luck of the Irish, The Economist, Oct 14th 2004

The Celtic Tiger, Benjamin Powell (Tech Central Station), 10 Sep 2002

Markets Created a Pot of Gold in Ireland, Benjamin Powell (Cato Institute), April 21, 2003

How Ireland Became the Celtic Tiger, Sean Dorgan (Heritage Foundation), June 23, 2006

A leste, nada de novo III

A resposta às últimas afirmações (relevantes) feitas pelo Saboteur antes das suas férias. Por uma questão de clareza, esclarecimentos meus sobre insinuações ou outras provocações não serão encontrados aqui. Quem entendeu o que disse na segunda parte não precisará de muito mais.

A única coisa que me deixa curioso é o facto de ainda nenhum de vocês ter tomado a iniciativa de rejeitar claramente o regime norte-coreano, apesar de a Joystick se ter picado com a ironia e o Saboteur dizer que eu sou um cretino no que toca ao conhecimento sobre socialismo e comunismo. Não sei se desejam iluminar-nos, a mim e aos restantes leitores. Também não sei se devo presumir que estou a tocar num assunto delicado e que aceitam o modelo de Pyongyang. Caso contrário, que aplicação da luta de classes têm exactamente em mente? URSS, China, Camboja, Albânia, Bielorrússia, Vietname, Cuba, Roménia, Angola, facções da guerra civil espanhola ou algo assim? Faço votos para que não seja uma coisa nova e refrescante do género "nenhum deles, porque não foi bem aplicado", "a revolução desvirtuou-se" ou "é preciso mudar as mentalidades primeiro".

Os comentários às opiniões lançadas sobre o artigo, a quem possa interessar:

1. A sua crítica baseia-se na típica confrontação da teoria com a realidade experimental. Nem eu disse que a concorrência era perfeita, nem que os mercados se equilibravam automaticamente, nem que os agentes faziam escolhas racionais, no sentido de percepção objectiva por um agente externo. Nenhuma destas coisas está implícita no artigo. Portanto, não faz sentido dizer que não sou heterodoxo, quando não penso nem ando com modelos marxistas, keynesianos ou sequer neo-clássicos no bolso à espera de ser sacados na devida altura. Assim, talvez seja boa ideia criticar o que está escrito em vez de se recorrer ao manual de instruções sobre o que criticar, para dar a ideia de uma qualquer falha epistemológica e ganhar mais uns adeptos.

2. O Saboteur diz que a pobreza é um problema de distribuição para depois embarcar no tradicional lugar-comum de que as pessoas estão desesperadas com a fome e, sem alternativas para sobreviver, trabalham para comer, embora não o tenham escolhido livremente. Aqui há o problema típico da abstracção total da realidade. Não existe quem consiga sobreviver sem ter de despender energia (sob forma mecânica ou de calor), ou seja, trabalhar para se alimentar. A comida não surge de forma automática a ser consumida: é produzida, transformada e transportada. Certamente que podemos dizer que o Homem não é livre porque é obrigado a fazer alguma coisa para sobreviver. No entanto, é necessário ter em mente que isso é uma crítica às leis físicas do Universo e à génese da espécie humana, o que torna a discussão em algo absurdo.

Quanto mais a riqueza for distribuída, mais se desincentiva a sua produção porque, ao não poder ser usada para a intenção de quem a gera, deixa de haver razão para produzir tanto, o que inibe o processo de crescimento. A torneira do dinheiro para subsídios, ordenados da função pública, etc. vai fechando aos poucos, até que o Estado abre falência ou aceita a liberalização na esperança de salvar a sua estrutura. Se se decidir que ter de trabalhar significa não ser livre, então o Homem nunca será livre nem alguma vez o foi. E infinitamente menos sob regimes socialistas (de toda a espécie), onde está obrigado a que o seu trabalho seja roubado sem ter direito de escolha sobre o seu destino. É esta uma das razões pelas quais muitos dos países mais pobres a nível mundial continuam a ser os mais pobres [ver ligações do ponto 5].

4. O bem-comum é um conceito propositadamente vago e desprovido de sentido porque não se pode definir algo que é subjectivo de uma forma colectiva. E o planeamento central já deu as provas da sua "ineficácia" (eufemismo) do ponto de vista económico e devastação do ponto de vista humano e social. Vários milhões tiveram de morrer para implementar essa forma de direcção espectacular que foi a autêntica praga do século XX e matou mais gente do que qualquer outra ideologia na história. Uma coisa é certa: é, de facto, a melhor forma de literalmente acabar com a pobreza e com a fome. Não havendo procura, não há necessidade de existência de oferta. Já vimos suficientes vezes esse exemplo aplicado à realidade, que tanto tem sido defendida no Spectrum, comparativamente aos alegados modelos de "sala de aula".

5. O comentário sobre a Irlanda não tinha directamente a ver com o sistema educativo. No entanto, ainda bem que é reconhecido que a Irlanda é um país evoluído e com um bem-estar cada vez maior. Agora, consulte-se aqui o índice de liberdade económica da Heritage Foundation, e onde se situa a Irlanda, ou se preferível, o índice do Fraser Institute [pdf] (outros parâmetros). Agora recorde-se o nível de riqueza média por pessoa da Irlanda (~$41.000), o ritmo a que continua a crescer (~5% ao ano) e a sua taxa de desemprego (~4%). [CIA Factbook] Alguma relação com o que eu afirmei no artigo? A Irlanda sempre foi um país tradicionalmente pobre. Outro bom exemplo é a Estónia, embora tenha referido a Irlanda precisamente pela semelhança que apresenta com Portugal, tendo em conta a condição descrita na frase anterior.

Thursday, August 03, 2006

Brønsted-Lowry

Carbonato sódico de di-hidróxido de alumínio



Posologia:

1 ou 2 comprimidos por cada refeição do dia, nem sabem o bem que fazia.

Disclaimer



O meu artigo tem feito chover bastantes críticas. Por um lado isso é bom, por outro é mau.

Primeiro, é bom, porque significa que as pessoas o leram. O facto de não o criticarem positivamente não significa que não concordem ou que não tenham ficado a pensar no que foi analisado. Muitas vezes é apenas um fenómeno psicológico de reacção que as faz defender aquilo que está mais enraizado nas suas crenças (está-se a lidar com uma religião) ou uma forma de se tentarem convencer a si próprias do que pensam, à medida que contestam o que foi afirmado, esperando ser provocadas novamente para testar as suas próprias convicções.

Por outro lado, é mau, uma vez que a maior parte das pessoas em Portugal julga que as discussões ideológicas ou académicas são uma espécie de toca e foge. A reacção típica é um refúgio sobre um qualquer lugar-comum ou frase feita já inventada há décadas atrás. O problema surge quando se questiona sobre o fundamento dessa ideia. Aí os argumentos, se existirem, começam a escassear. Muitos desistem de imediato da discussão, avançando que não discutem política, como se se tratasse de uma questão de equipas de futebol. Outros, ficam com um ar muito intrigado e não esboçam nenhuma resposta, acabando por se calar ou chegar a um ponto em que insultam o mensageiro. A versão blogosférica deste fenómeno são os apontamentos fugazes feitos nas caixas de comentários e que, depois de questionados sobre a sua base argumentativa, ficam sempre sem resposta. Passam-se semanas e o contador de estatísticas diz que essas pessoas voltaram mas a pergunta ficou para sempre sozinha no meio de tanta asneirada política e/ou económica.

Outros ainda, ficarão perdidos num "talvez tenha razão", sem assumir que a outra parte efectivamente a tem e recusando-se, mesmo perante a sua incapacidade de argumentar, a dar o braço a torcer e aceitar uma realidade que se forma diante dos seus olhos, mas a qual têm uma dificuldade enorme em interiorizar.

Vem isto a propósito da crítica que mais tenho notado; a versão complementar, mas implícita, da mentira que exponho no artigo. Lado a lado com a ideia de que o capitalismo explora os pobres (isto já vem da revolução industrial), caminha a de que apenas os ricos podem defender o capitalismo. Ou seja, consequentemente, eu sou rico e devo estar a nadar em dinheiro.

Vamos lá pensar juntos um bocadinho. Se eu fosse rico, estaria aqui durante as minhas horas livres a escrever (a custo zero) para umas poucas dezenas de gatos-pingados cuja maioria não conheço de lado nenhum, quando a classe média e alta está praticamente toda de férias, em pleno Agosto? Incomodava-me em comentar assuntos que julgo serem relevantes, não só para mim, como também para os outros? Qual seria o estímulo para os poucos - mas perseverantes - liberais da blogosfera portuguesa manterem os seus blogues em actividade durante todo o ano, incluindo o Verão em muitos casos, quando poderiam estar a usar o seu dinheiro numa qualquer estância de luxo?

Ganhem juízo. E em vez de me pedirem para "pensar nos mais pobres" ou qualquer outro chavão zen, pensem vocês na pobreza intelectual que vai dentro dessas cabecinhas e se há alguma forma de alterar isso. Já agora, nada de benefícios burgueses por aqui, como essa coisa a que chamam de férias. Terão de me aturar durante o resto do Verão. Passem por cá se desejarem ou não tiverem nada melhor que fazer. Cá estarei, com qualquer coisa escrita recentemente sobre um tópico que julgue relevante.

Wednesday, August 02, 2006

Pavlov

Capitalismo!

A leste, nada de novo II

[Seja bem-vindo, caro leitor do Spectrum. O artigo em discussão encontra-se aqui. Sinta-se à vontade para ler. No melhor dos princípios capitalistas, está disponível de forma totalmente gratuita]

O Joystick, um colega do Sr. Saboteur, respondeu-me (talvez seja apenas um alter ego, em regimes colectivistas não há diferenciação pessoal, é tudo uma só entidade colectiva e unida) para se entreter a fazer uma pequena estalinização colectiva pessoal do que eu escrevi previamente.

Não compreendo por que razão se preocupa subitamente com as técnicas de argumentação e com a minha (semi-)ironia sobre a Coreia do Norte; é que não mostrou nenhuma indignação perante o que o seu colega de blogue fez inicialmente e que, ao contrário do que foi por aqui dito como reacção, não teve a delicadeza de evitar o ataque pessoal. Talvez assumam que os visados não lêem e, por isso, dizem as coisas que vos apetece sem que haja direito ou intenção de resposta? Na verdade, não só duvidosamente me tentou ligar aos EUA - mas, claro, eu é que desvio o assunto ao falar da Coreia do Norte - e ao neo-conservadorismo (o que seria incrivelmente irrelevante, mesmo a ser verdade), como criticou e apontou características tão importantes para a questão como a minha idade, a forma do meu artigo (conteúdo, nem pensar, isso, para além de dar trabalho, é difícil), o meu presumível pedantismo e se pôs a inventar mentiras sobre o que se dizia por aqui acerca da guerra no Líbano, etc. Quer mesmo que eu faça uma lista extensiva das falácias que ele cometeu ou já percebeu que as suas observações e tentativas de ridicularização são próprias de quem vive num clip do Gato Fedorento?


Porque não estou com muita vontade de discutir solipsismos, aqui ficam quatro breves esclarecimentos:

1. Em todas as transacções livres, conscientes e voluntárias, não há, por definição, coacção. A coacção a que me refiro é a existência de intimidação ou ameaça por parte de um dos envolvidos. Como estamos a falar de capitalismo, ou seja, de homens livres e transacções livres, não existe coação entre as partes. Quando muito, a única entidade que age por meio de coação (e desincentivo) é o Estado, encarregando-se de regular tanto a transacção como os valores envolvidos. Mas mesmo no caso do capitalismo, essa coação - ainda que externa à transacção - ou não existe ou é mínima.

2. Não sei que mais precisa de ser demonstrado. Talvez o Joystick (nome familiar) seja rico e não sinta tanto esses problemas na pele como os mais pobres. Se for esse o caso, também compreendo que não conheça nenhum pobre (a esquerda leva isso da divisão de classes muito a sério) que alguma vez se tenha queixado de falta de dinheiro ou de falta de produtos mais baratos. Tente lá relacionar isso com o que disse no artigo sobre impostos, regulações e investimento. Quanto aos impostos, acha mesmo que os eleitores sabem que o socialismo defende a existência de impostos (elevados)? É que a maioria julga que a questão dos impostos é independente de ideologias políticas, pertencendo apenas à opção casual de um partido ou ligada a conjunturas económicas particulares. Será que esta informação é do interesse dos eleitores ou não a devemos divulgar?

3. Se permite concluir algo é que a existência de regulação social danifica os mecanismos normais de transferência de informação e riqueza numa sociedade livre, que é exactamente o oposto da conclusão que o Joystick sugere. Já agora, mercado não significa empresários ricos, nem empresários pobres. É apenas outro nome para o conjunto todos as pessoas envolvidas em actividades económicas. Mercado significa nada mais, nada menos, do que a faceta económica das pessoas, da sociedade.

4. Muita, muita confusão. A economia não pode ser uma entidade divina quando é uma consequência natural da actividade humana. E está tão próxima do Homem (há uma diferença entre o que se gostaria que fosse a realidade e o que é efectivamente a realidade) que a mais pequena oscilação influencia toda a gente. Compreendeu a parte sobre a noção de corpo dinâmico ou o alegado barroquismo do texto também o deixou confuso? Quanto à responsabilidade humana, é muito curioso o que diz. É que não consigo imaginar outro regime económico que mais assente sobre a "responsabilidade humana sobre os seus próprios sobre actos e escolhas" do que o capitalismo, que se baseia precisamente na responsabilização individual dos seres humanos pelas seus acções. Liberdade e responsabilidade andam constantemente de mãos dadas. Julgar que o capitalismo menospreza o Homem é muito bonito em termos poéticos. Mas como vivemos mundo real e não no do existencialismo, quais são exactamente as outras opções existentes que não menosprezem o Homem e permitam que este seja livre para dar cor às suas capacidades e potencialidades?

Para finalizar, não compreendo exactamente qual é a vossa oposição ideológica ao meu artigo. Pensei que o comunismo era a favor da heresia e do pensamento revolucionário, contra-corrente.

Tuesday, August 01, 2006

A leste, nada de novo

Dia D: Comunismo, disfarçado de falácia ad hominem, a favor claro da discriminação etária e política. Para quando a tão desejada mudança para o paraíso democrático da Coreia do Norte?

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Nota: Não foi explicado nada sobre o que era o artigo e em que consistia. Repulsa ideológica ou medo de que algum dos leitores pudesse ficar com vontade de o ler?

Mitologia do pauperismo

Texto publicado ontem, 31 de Julho, na Dia D:

Um dos argumentos tipicamente dissuasores do capitalismo baseia-se na sua suposta aplicação exclusiva a sociedades abastadas. Outras versões mais comuns da mesma tentativa infrutífera de refutação passam por afirmar que esta forma de organização económica apenas beneficia os ricos, pois aumenta a sua riqueza através da "exploração" dos mais pobres. Tal mundividência deturpada revela, de uma forma bastante ilustrativa, como a análise factual dos que reclamam defender a aplicação de políticas de protecção social é, na verdade, demasiado simplista e pueril quando comparada com as intenções alegadas no seu discurso sobrecarregado de influência marxista.

Deliberadamente viciados a interpretar a economia como um acto bélico, os detractores da liberdade constantemente esquecem que cada transacção económica consciente e voluntária apenas se verifica quando ambas as partes crêem obter de si um benefício, uma vez que seria necessária a recorrência à coacção para que o contrário fosse expectável. O indivíduo x não pode “explorar” o indivíduo y quando ambos concordam e aceitam as condições previstas no contrato estabelecido, seja ele de natureza comercial ou laboral e sejam os indivíduos x e y, alternadamente, ricos ou pobres.

Em paralelo, a economia ressente-se de forma dinâmica quando um dos parâmetros que mais a influencia é significativamente modificado, sendo irrealista presumir que a abusiva acção fiscal e reguladora dos governos não representa um fardo para a sociedade da qual todos – pobres e ricos – são parte integrante. Quem ignora os efeitos de tais escolhas tende a avaliar erradamente os mais desfavorecidos como se estes estivessem isolados do sistema económico sobre o qual são pensadas as propostas a aplicar. Não só esta concepção é uma antítese da realidade como também se omite regularmente que na opção anti-capitalista os pobres não estão isentos de pagar impostos, reduzindo directamente o seu poder de compra, e são constantemente sujeitos a prejudiciais restrições de mercado que os impedem de consumir produtos adaptados à sua realidade financeira – e ao valor que lhes é subjectivamente atribuído – por meros caprichos definidos através de uma decisão fundamentada em critérios políticos.

Outro aspecto convenientemente olvidado é o resultado repelente que os impostos e outras imposições têm sobre o investimento feito num determinado país. A menos que se pretenda negar os benefícios evidentes da entrada (ou permanência) e aplicação de capitais quanto ao preço e à qualidade de produtos e serviços, as oportunidades de emprego existentes e respectivas melhorias a nível da competitividade da sua própria oferta, é bastante evidente que os mais pobres saem claramente lesados numa sociedade em que também os empresários mais ricos vêm a sua liberdade económica reduzida e, como tal, desincentivados da busca permanente pela eficiência na qualidade e distribuição dos recursos – critérios naturais inerentes ao crescimento económico – e obrigados a adaptar a oferta final ao consumidor de forma a cobrir os aumentos artificiais dos respectivos custos.

A suposição recorrente de que o capitalismo menospreza os mais pobres é, portanto, um mito. A sua natureza reside essencialmente na incompreensão sobre a origem da pobreza que, ao contrário do comummente sugerido, não consiste em assimetrias de distribuição mas sim de produção. Os países ricos apenas puderam adquirir tal estatuto através da concessão de maior liberdade aos seus cidadãos para produzir progressivamente bens mais valorizados, permitindo que estes detenham o direito legítimo ao fruto do seu trabalho de forma capitalista, ou seja, com liberdade para o comerciar num mercado também ele livre.

O caminho que Portugal que poderá trilhar, visando o abandono gradual do torpor económico que historicamente tolhe o seu desenvolvimento, é o equivalente aos dos países que, como no caso próximo e recente da Irlanda, transformaram as suas limitações de modo a acolher uma liberalização da economia e, consequentemente, um respectivo aumento da qualidade de vida. Esta via está inteiramente dependente do desejo dos portugueses em serem livres.

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Agradecem-se as simpáticas referências feitas nos blogues Blue Lounge, O Insurgente, A Arte da Fuga e Bodegas.